sexta-feira, 24 de abril de 2009

Capitulo Treze - Planos

O silencio tornou a atmosfera entre nós angustiante. Queria que Matt falasse algo. Podia ser uma bobeira qualquer para puxar assunto, servia até um ‘ A lua está perfeita hoje’ como os meninos de filmes faziam para que a garota soltasse um riso e descontraísse a conversa. Mas nada, ele permanecia calado, sem expressão. Eu realmente o machuquei, mas o que ele esperava? Ele havia de entender. Eu acabara de ouvir que vampiros existiam. Eu estava em choque.

- Desculpe. – tomei uma iniciativa.

E funcionou, ele finalmente deu sinal que percebera que eu estava ali. Ele se virou, e olhou em meus olhos. Parecia tão melancólico e diferente do Matt que sempre sorria para mim. Me senti culpada, tentava amenizar a culpa pensando que eu estava em trauma e incapaz de raciocinar uma reação. E ele continuou em silencio me deixando frustrada.

- Entendo Anne, não precisa se desculpar. – sua voz estava longe do tom musical que tinha, estava rouca e sem vida.

Eu sorri para ele, mesmo com meus músculos faciais quase paralisados em meio ao frio. Ele não reagiu, nem um sorriso e nem um esforço para um. Naquele momento, eu queria abraçá-lo, queria que ele percebesse o quanto eu estava arrependida. Porém me faltava coragem. Consegui com esforço, levar minha mão ao seu rosto perfeito. Meus dedos estavam formigando de tanto frio que fazia. Afaguei seu rosto esperando que ele relaxasse.

- Eu por muito tempo odiei o que me tornei. Eu não queria ser assim Anne, eu queria ser um adolescente normal, me preocupando com garotas, e não com guerras entre raças. Naquele momento, que você me olhou aterrorizada, meu pior medo se tornou real. Sempre temi, que a pessoa que eu realmente gostasse, tivesse medo do que sou. Medo do que pudesse fazer a ela. – desabafou ele.

As palavras serviram como estacas em meu peito. Eu o fizera sentir assim. Eu fizera seu pior medo se tornar realidade. Ele me protegeu, e eu o fizera se sentir desta forma. Então ele gostava de mim, mesmo sendo fútil demais para aquele momento, consegui sorrir com esse aspecto.

- Eu não tenho medo de você. – tentei fazer a coisa se amenizar.

- Não tente se enganar Anne. Eu vi do jeito que você me olhou. –sua voz continuava naquele mesmo tom angustiante.

- Eu não tenho medo de você. – afirmei novamente. Pelo visto ele não ia se convencer. Eu havia de provar.

Abaixei o capuz e me aproximei de seu rosto, ele pareceu surpreso com a minha atitude. Eu estava tão perto, que podia ouvir sua respiração, ele estava quase ofegando. Pelo menos ele podia respirar, meu coração estava paralisado. Pensei em recuar, mas tomei coragem. Eu beijei seu rosto suavemente. Ele estremeceu com o contato dos meus lábios em sua pele fria. Me diverti com a situação, e levei meu rosto até seu ouvido, de maneira que meu pescoço ficasse perto de sua boca. Acho que não havia melhor forma de provar que eu não sentia medo.

- Eu não tenho medo. – sussurrei, tentando não rir.

- Você está brincando com o fogo Anne. – disse ele, com a voz musical de volta, parecendo esconder um riso.

Eu recuei com um sorriso no rosto, e ele estava rindo. Seu sorriso perfeito mais uma vez estampado no seu rosto. Me senti mil vezes melhor.

- Agora acredita? – disse sentando novamente ao seu lado.

- Você é tão bobinha. – disse ele rindo e pegando minha mão.

- Se você não queria ser um deles, por que decidiu se transformar? Sam me disse que há uma escolha. - disse sem pensar, talvez me arrependesse por ter voltado ao assunto.

- Não tiveram a chance de me perguntar. -disse ele olhando para o nada.

Decidi ficar calada, esperando que ele continuasse.

- Eu estava perto de minha casa, até então eu não sabia dos meus genes, nem imaginava que era adotado. – ele olhou para mim, esperando que talvez aquilo me afetasse, tentei continuar indiferente – Tive a infelicidade de encontrar um grupo da outra raça.

“Eles estavam falando alto, eles falavam coisas como ‘ele é meu’. A rua estava deserta e não havia ninguém a quem eu pudesse recorrer. Minha rua era cercada por uma pequena floresta, e eu corri em direção a ela na esperança que eles me deixassem em paz. Eles pareciam se divertir com o que estava acontecendo. Aconteceu rápido demais, eu estava escondido quando senti algo me arremessar. Eu estava tonto demais para levantar e tudo foi ficando escuro. “

- Pelo que me contaram, a sorte estava do meu lado. Sam e outros estavam caçando pela aquela área, e me encontraram sendo massacrado pelo outro grupo. Eles lutaram, e o outro grupo que estava em desvantagem fugiu. Sam sentiu meu cheiro e percebeu que eu era um deles. E me transformou ali mesmo.

Realmente ele não tivera opção. Então havia sido Sam que o transformou, ele não tivera a opção de escolher. Seu rosto estava sem vida novamente, mas eu queria lhe fazer uma pergunta, apenas uma.

- Dói? – a pergunta me escapou.

- Não quero mentir para você. A dor é insuportável, durante toda transformação. – disse ele sinceramente.

Eu não queria pensar na possibilidade de ter que virar um deles, isso sim me deixava com medo. Um vento frio tocou meu rosto e eu tremi. Matt percebeu minha reação e logo levantou me puxando delicadamente.

- Vamos Anne. Você deve estar exausta. – seu sorriso estava mais uma vez no rosto.

Levantei e ele segurou minha mão ainda sorrindo. Caminhamos juntos até a casa, eu um urso desajeitado e a reencarnação da beleza.

Sam nos esperava na porta e pegou meu braço assim que cheguei.

- Eu comando a partir de agora. Pode deixá-la. – pelo que me parecia Sam não ia muito com Matt, nem Matt com o Sam. Eu parecia ainda mais idiota agora, no meio dos dois. Matt olhou de cara feia para Sam, e olhou para mim.

- Durma com os anjos, minha Anne. – ele beijou minha testa, e sorriu para mim.

Não podia negar que o ‘minha Anne’ fez meu humor melhorar excessivamente. Matt se juntou um grupo que estava perto da TV.

Sam o seguia com os olhos até chegarmos ao topo da escada. Sua expressão mudou instantaneamente quando olhou para mim.

- Louise vai te dar roupas novas; tome um banho e se troque. Está bem? – ele apontou para a mulher que estava na minha casa, eu não havia reparado sua presença. Ela sorriu para mim e eu retribui.

- Tudo bem Sam. – falei carinhosamente.

Eu ia começar a andar quando Sam me puxou delicadamente e falou tão baixo que quase não consegui entender.

- Não faça mais aquilo com Matt, ele pode perder o controle. – ele parecia com raiva, mas ao mesmo tempo debochado com o que acabara de dizer. Senti o sangue correr para meu rosto.

- Já pedi para não entrar na minha cabeça. – tentei parecer inocente.

- Não foi na sua que vi. Foi na dele. – é ele realmente estava debochando. Ele desceu as escadas rindo provavelmente lendo os xingamentos em minha mente.

- Então vamos. – disse ela me apressando.

Tratei de andar até ela. Louise entrou em uma das primeiras portas do extenso corredor. Meu queixo caiu assim que entrei.

- UAU! – só consegui dizer isso.

Eu não entendia muito de moda, mas podia afirmar que naquele quarto tinha roupa de todos os estilos possíveis e pelo visto não eram roupas baratas. Eram vestidos, blusas, calças, sapatos, muitos sapatos por sinal. Ouvi um risinho abafado.

- Nossa, quanta coisa. – um vestido azul marinho me chamou atenção, fui até ele por curiosidade. O tecido era sem duvida finíssimo, parecia seda, mas ela extremamente macio.

- Gostou deste? – ela estava ao meu lado antes que eu pudesse dar conta.

- É lindo.

- É seu. – disse ela sorrindo.

- Não, não, não posso aceitar. Deve ter custado caro. – mesmo achando perfeito, provavelmente não havia ocasião para usá-lo.

Ela riu musicalmente.

- Caro Anne? Acho que Sam não explicou exatamente o que você é ou tem. – a claro, aquela historia toda passou novamente pela minha cabeça, tinha que admitir que aquilo tudo me incomodava demais. – Tome, eu te levo até o seu quarto. – ela me entregou uma muda de roupa e acenou com a cabeça para a porta.

- Meu quarto?

Ela riu novamente, andando até a porta. Andar ao lado dela, era de certa parte humilhante. Ela parecia desfilar ao invés de andar. Ainda por cima, eu ainda estava desengonçada por parte da quantidade de casaco que vestia.

- Seu quarto. – disse ela abrindo uma das portas no corredor.

Meu quarto? Aquilo tudo era meu quarto? Dava para fazer uma festa lá dentro. Era enorme e extremamente luxuoso. Até lareira tinha. As paredes eram pintadas em vários tons de verde. Fiquei deslumbrada.

- Não vai entrar? – sua voz era extremamente musical.

A temperatura dentro do cômodo estava mais agradável, pude em fim retirar as camadas de proteção.

- Vou deixar você à vontade Anne, qualquer coisa me chame. – ela sorriu docemente.

Antes que eu pudesse responder, ouvi a porta se fechando. Já no banho, pude finalmente por em ordem meus pensamentos de tudo que ocorrera no dia de hoje. Era muita coisa para processar em minha mente.

Minha garganta dava um nó só de lembrar da parte da mentira. Eu odeio mentiras, odeio ser enganada. E imaginar, que todas as palavras ditas a mim desde que me entendo por gente, eram parte de uma mentira. Isso doía muito. Nesse momento eu só queria dormir, só queria descansar e tentar esquecer tudo. Começar uma nova vida seria uma boa escolha? Não sabia se era forte o bastante para um recomeço. E o que seria esse recomeço? Viver no meio de vampiros, com meu irmão mais velho governante deles? A palavra vampiros não havia sido filtrada totalmente pela minha cabeça.

Eu tinha certeza que meus pais, ou melhor, aqueles que eu achei serem meus pais, me procurariam por todo país. Eles colocariam a policia toda a minha procura, e não desistiriam até me encontrar. Disso eu tinha certeza.

Sam me dissera que havia uma escolha, qual seria a minha? A idéia de me tornar igual a Sam, ou Matt me fazia estremecer. Era tudo muito estranho, muito confuso. Precisava esclarecer melhor.

Deitei na cama esperando adormecer rapidamente, mas ali sozinha, na escuridão, me senti mais frágil do que nunca, sozinha sem ninguém que eu conhecesse bastante para confiar. As lagrimas que escorreram, eram reflexo da dor que me tomou por dentro. Abracei um travesseiro procurando um abrigo, me senti um pouco melhor. Procurando um alivio, eu adormeci.

- Eu não admito erros. – mais uma vez, sabia que aquele corpo não era o meu.

- Você estava lá senhor, sabia que a chegada daqueles imundos não era esperada. – o homem a frente tentava se justificar, seu rosto demonstrava desespero.

- Está dizendo que foi minha culpa o fracasso, Eric? – senti o ódio ferver em minhas veias.

- Nunca senhor, nunca. – ele se embolava com as palavras.

- Cale e boca e faça algo de útil. Chame Marcus, agora.

Ele correu em direção à porta. O lugar me lembrava as antigas igrejas do século XVIII, e era decorada com espelhos gigantes em cada parede. A impaciência fez com que andasse de um lado para outro do imenso salão. Ao passar pelos espelhos percebi que a imagem refletida neles, era daquele de quem eu fugia,o meu tio.

A porta se abriu e dois homens adentraram no local. A face de desespero ainda presente no homem que a pouco estava aqui, já o outro homem, era Marcus. Podia afirmar por que ele esteve na fazenda de minha avó naquele dia horripilante.

- O que deseja meu senhor? – Marcus era o oposto do homem ao seu lado. Seu rosto demonstrava calma e frieza ao mesmo tempo.

- Quero que trace um plano, e que desta vez não falhe. Quero-a em minhas mãos o mais rápido possível. – Marcus assentia com a cabeça, cada palavra dita.

- Queres invadir a cede deles em busca da garota? – Marcus falava tranquilamente.

- A garota é um bem precioso, sabes disto. Precisamos recuperá-la antes que Sam descubra seu real valor.

- Como quiser meu senhor. – ele assentiu mais uma vez com a cabeça e se retirou. O outro homem grudado nele como se fosse sua sombra.

Os primeiros raios solares entraram no cômodo me fazendo acordar.

- Você se mexeu a noite inteira Anne. – uma voz musical me fez levantar abruptamente.

- Sam? – a forte luz vinda da janela, me impedia de ver seu rosto.

- Isso mesmo. – quando dei por mim, Sam estava sentado ao meu lado na cama.

Esfreguei o meu rosto tentando acordar.

- Que horas é Sam? – perguntei me espreguiçando.

- Quase onze, Bela Adormecida. – ele riu musicalmente.

- Nossa... – mesmo tendo ido deitar cedo, eu ainda me sentia cansada.

O quarto estava abafado, prendi meu cabelo. Ao passar a mão pelo meu pescoço, senti uma ardência.

- Ai... – reclamei.

- O que ouve Anne? – a preocupação visivelmente na voz dele. Ele chegou mais para perto, me olhando profundamente. Deduzi que ele tentava me ler- Ah. – seu rosto ficou vazio.

- Essa droga de alergia. – passei a mão levemente tentando amenizar a dor.

- Não é alergia Anne. – ele parecia certo com o que dizia.

Esperei que ele continuasse.

- Lembra que eu te falei de alguns sintomas? Então... – ele deixou que eu deduzisse o final.

Então era um dos sintomas. Droga, isso me deixou extremamente irritada. Mas algo se fez mais importante.

- Sam, posso te mostrar uma coisa?

Ele não respondeu, apenas acenou para que eu continuasse.

- Vamos ver se funciona, hum, eu penso e você vê! Está bem?

Ele pareceu confuso. Peguei sua mão e fechei os olhos, tentando me concentrar em pensar em todos os detalhes. Funcionou bem, pensei em todo meu sonho da noite que se passara, cada detalhe, cada fala.

- Como você faz isso? – ele perguntou espantado assim que terminei.

- Sei lá, são sonhos somente não é? – perguntei confusa.

- É a primeira vez que isso acontece Anne? – ele ignorou minha pergunta.

- Não. Na verdade é bem constante.

Ele pareceu transtornado, mas sua face mudou rapidamente parecendo ficar tranqüilo. Perguntei-me se aquilo era uma mascara, para não me preocupar.

- Seu café da manha está aqui. – disse ele apontando para a beira da cama, eu não havia notado a presença da bandeja antes. – Tem também roupas novas no seu armário. Preciso ver Michael urgente, você fica bem Anne?

- Tudo bem Sam. – me preocupou que sua urgência em encontrar Michael, tivesse ligada ao que mostrei a ele.

Levantei num pulo só e comi tudo rapidamente. Meu armário me deixou irritada, não gostava de tanta roupa e a maioria não fazia muito meu estilo. Peguei a mais simples possível e um moletom caso estivesse frio como ontem.

Tomei um banho rápido tentando não ficar especulando sobre o futuro como fizera ontem, havia decidido que o que tiver que ser, será. Dane-se viver no meio de vampiros, Sam me dissera que nada de mal eles fariam a mim, além disso, eu tinha Matt. Parei no espelho do enorme banheiro, para prender meu cabelo para cima. A sensação dele roçando em meu pescoço fazia arder ainda mais. Meu pescoço estava muito irritado e me causava uma sensação desagradável.

Eu já estava no meio do corredor, pensando se teria coragem de descer a escada sozinha. Parecia idiota, mas eu era tímida e com certeza todos olhariam para mim novamente, isso me deixava constrangida.

- Anne. – senti a voz perto de mim e me virei automaticamente.

Era Matt e ele estava mais perto de mim do que imaginei. Pulei para trás com o susto e me arrependi de ter feito isso. Ele me olhou surpreso.

- Desculpe Anne, por favor, não tive a intenção de te assustar. – ele se embolou com as palavras.

- Eu que estava distraída. – ele estava perto de mim novamente e só isso importava. Sorri tentando animá-lo e ele retribuiu com o sorriso que eu tanto gostava.

- E então, ia fazer o que? – seu sorriso ainda presente.

- Hum, tentando tomar coragem para descer. – falei sinceramente.

Ele pegou minha mão delicadamente, sua pele continuava gélida, e me puxou delicadamente em direção a escada. Com ele era mais fácil, como percebi nas outras vezes, tudo era mais fácil perto dele.

- Quer ir lá fora? – disse ele docemente enquanto descíamos as escadas.

Assenti com a cabeça. Eu iria a qualquer lugar com ele. A sala pelo contrario do que imaginei, estava vazia. Bom, quase vazia, um pequeno grupo estava perto da cozinha, conversando em sussurros. Reconheci um deles, era o medico que tentara ontem me atender. Tentei não olhar diretamente para eles, na esperança de que ele não lembrasse da nossa ‘consulta’. Tarde demais.

- Anne. – ele já estava a menos de um metro de mim. Como eles faziam isto? – Seu irmão pediu para que eu verificasse se esta tudo bem com você. Ele me disse que foi uma pancada forte.

Olhei para Matt, esperando que ele me salvasse dessa. Mas ele permanecia calado.

- Olha, agradeço a preocupação. – tentei ser o mais doce possível. – Mas eu to bem. Sem dores nem nada e além do mais eu estou de saída, não é Matt?

- Anne, na verdade, eu achava bom você ser examinada, a pancada foi forte. – não acreditava, era desnecessário tudo isso.

- Sente-se aqui Anne, será rápido, prometo não te alugar por muito tempo. – ele apontou para uma cadeira que estava perto de nós.

Sentei-me irritada, fazendo beicinho. Era tudo muito desnecessário, se eu me sentia bem, para que tanta preocupação? E por que Matt tinha que concordar com essa besteira toda? Bobo. Eu o fuzilava com os olhos.

O medico pediu para que eu abaixasse a cabeça e tocou bem onde eu havia me machucado. Tinha que admitir que me incomodou um pouco, mas nada preocupante. Ele perguntou se sentia dor, eu menti dizendo que não sentia nada.

- Eu acho que foi só a pancada, nada de danos colaterais. Vou te liberar por enquanto Anne, mas qualquer dor, qualquer tontura, me avise está bem? Vou permanecer uns dias aqui mesmo. – disse ele sorrindo.

- Prometo avisar, agora posso ir? – eu ainda estava bem irritada para prestar atenção, só queria sair dali.

Ele assentiu e eu fui me dirigindo à porta, ignorando a mão estendida de Matt. Fiz questão de batê-la o mais forte possível. Mas me arrependi, lá fora estava como a sala ontem. Cheio de vampiros que sempre me olhavam com curiosidade. E bater a porta daquela forma, chamou mais atenção. Corei ao reparar em todos os olhares que vinham em minha direção. Matt saiu da casa, confuso.

- O que houve Anne?

Virei a fim de ficar olho a olho com ele, era infantil o que eu estava fazendo, mas ele conseguira me tirar do serio. Ele riu.

- Ta rindo de que? – minha voz saiu ríspida.

- Você fica ainda mais linda quando fica com raiva. – ele disse docemente me fazendo corar ainda mais. – Envergonhada também.

Droga. Era impossível dar gelo nele. Seu olhar apelativo tinha real efeito em mim.

- Vamos sair daqui, por favor. Não gosto de tantos olhares em mim. –testando mais uma vez meu olhar implorativo.

- Claro Anne, vou te levar em um lugar especial. – um sorriso já brotando no canto de sua boca.

Andamos juntos, no meio de todos que estavam presentes. Procurei Sam, mas ele não estava ali. Provavelmente, ainda estava com Michael. Louise olhava para Matt de cara feia, talvez ela compartilhasse a mesma opinião que Sam. Reconheci Pablo ao seu lado, mexendo no motor de um carro. Matt me levava em direção a floresta que cercava a casa. Grande casa na verdade, olhando por fora e detalhadamente, ela ainda parecia maior. O numero de janelas que ela continha, estava proporcionalmente ligada ao numero de portas do extenso corredor. Percebi que ela não tinha somente dois andares, mas sim quatro. Eu não havia reparado anteriormente.

Não adentramos muito na floresta e de longe reparei aonde Matt queria me levar. Um riso baixo escapou.

- Você só pode está brincando.

- Você precisa ver a vista lá de cima. – ele parecia extremamente entusiasmado.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Capitulo Doze - Mais verdades

- Supondo então que eu sou mesmo sua irmã... – comecei, Sam bufou - Até que parte eu sou semelhante a você?
Ele pareceu entender a que ponto eu queria chegar. Ele se curvou para mais perto de mim, e segurou uma das minhas mãos. Eu ainda estava assustada com tudo que ele estava me falando e sua pele gélida me fez arrepiar, me esforcei e mantive minha mão junto à dele. Tanto ele quanto eu, balançávamos o pé em sinal de ansiedade.
- Até que ponto você gostaria de ser semelhante? – ele me perguntou.
- Me explique. – o desafiei novamente.
Ele apertou mais forte a minha mão e eu esperei que ele me respondesse. Por um breve tempo, o silencio tomou a pequena sala, até que a voz musical de Sam o quebrou.
- É complicado de se explicar, vou tentar resumir, para seu melhor entendimento.
“Filhos de vampiros nascem humanos, porém trazem traços de seus pais no sangue. A certa idade, esses traços começam a se manifestar, por pelo que vamos dizer ‘sintomas’. Geralmente é neste período em que damos ao individuo, o direito de escolher. Entre permanecer humano e envelhecer normalmente, ou ser transformado totalmente. Existe um período, pelo qual esses traços podem se manifestar. Depois de certo tempo, eles ficam adormecidos, e não mais se manifestam”
Então era assim que funcionava, se tinha uma escolha. Meus olhos caíram sobre o relógio, perto da mesa onde estava um computador. Os ponteiros marcavam seis horas em ponto. Assustei-me com a velocidade que o tempo passara. Meus pais deveriam estar preocupados, eu havia de arranjar uma forma de me comunicar com eles.
- Hei Sam, posso te pedir uma única coisa? – tentei ser amigável.
- Claro, Anne.
- Posso fazer uma ligação, uma única ligação. Prometo que talvez ela mude muita coisa. Por favor. – tentei mais uma vez o meu olhar implorativo e fiz beicinho.
- Imagino para quem seja. Tome. – disse Sam me entregando um celular.
Disquei os números o mais rápido que pude, e aguardei que do outro lado da linha alguém atendesse. Não demorou muito para que minha mãe, com uma voz de esperança, atendesse o telefonema.
- Alô? – disse ela chorosa. Respirei fundo e engoli seco antes de responder.
- É a Anne mãe. – minha voz saiu sem vida. Sam na minha frente me olhava pacientemente.
Eu sabia que ela reagiria daquela forma, percebi pelo barulho aos fundos que ela não estava sozinha.
- Anne graças a Deus! Onde você está? Você está bem? Alguém te machucou? – ela se perdia em meio a tantas palavras.
Respirei fundo, contendo as lágrimas, uma pergunta era necessária para que eu encerrasse essa ligação.
- Eu estou bem, não fizeram nada comigo. Por favor, me responde uma pergunta? – tentei ser o mais indiferente o possível, mas por dentro a angustia me tomava.
- Anne, o que está acontecendo? Sua voz está estranha, onde você está Anne? Responda-me, preciso te ver bem. Tem alguém te controlando? Anne?
- Uma pergunta, uma resposta. – disse friamente.
- Fale Anne, você está me assustando.
- Você... – engoli seco ao tentar pronunciar as próximas palavras – Você é minha verdadeira mãe? Ou eu... - os restos das palavras pararam na minha garganta.
No outro lado da linha, só conseguia ouvir a respiração de minha mãe, que se tornava mais intensa a cada segundo. Ouvi a voz do meu pai, ao fundo da ligação perguntando o que estava acontecendo.
- Anne, a gente iria te contar quando fosse a hora certa. – o sussurro de minha mãe, quebrara o silencio.
Meu mundo naquele instante sucumbiu, só consegui fechar o celular e o largar. O barulho dele caindo ao chão, se sobressaiu em meio aos meus gemidos de dor. Escorreguei para o chão, e fiquei ali, me sentindo sozinha como nunca tivera sentido antes. Meus pais, aqueles que por tanto tempo amei, aqueles que me ensinaram a andar de bicicleta, me acompanharam nos momentos difíceis da minha vida, eram parte de uma farsa. Sam havia de todo tempo falado a verdade, e eu acreditei naqueles que mentiram minha vida inteira. Eu não sabia se os odiava por todas as mentiras. Eu não sabia de nada. Eu era uma mentira, minha vida inteira se tornara uma mentira.
Reuni forças para olhar diretamente para Sam. Ele estava falando a verdade, aquele homem na minha frente, era meu irmão. Minha mãe estava enterrada em uma ilha, ela sacrificara sua vida pela minha. Meu pai, provavelmente tivera o mesmo destino.
Neste momento tudo mudara. As lagrimas escorriam sem parar. Abracei meu joelho procurando uma proteção. Encontrei o olhar apreensivo de Sam.
- Desculpe. – Consegui falar em meio a lagrimas.
- Você não tem que se desculpar Anne. A culpa não foi sua. Só quero você bem. – ele se levantou e sentou ao meu lado.
Ele tentou me proteger, e eu o neguei. Imaginei o quanto foi difícil para ele, me olhar e não poder me contar a verdade. Naquele momento, esqueci da historia dos vampiros, de tudo que ele me contara, esqueci dos meus medos. Eu só precisava fazer uma coisa.
- Sam, - consegui dizer em meio aos soluços – Posso fazer uma coisa?
- Não precisa pedir Anne.
E eu me joguei em seus braços e o apertei com todas minhas forças. Ele retribuiu o abraço. Percebi que ele também chorava.
- Te esperei por tanto tempo. – afastamos nossos corpos, e nos olhamos, olho no olho. Pela primeira vez, o olhar de Sam não trazia um sentimento ruim, eu via felicidade em seu olhar.
Ficamos ali por um bom tempo nos olhando, minha mente aos poucos voltando ao normal. Mas por dentro, eu sentia falta de uma parte de mim.
- Você deve estar com fome não é? – disse ele preocupado, quebrando o silencio.
Eu realmente estava faminta, fazia horas que eu não colocava um alimento na boca.
- Pra falar a verdade... - antes mesmo de eu terminar a frase, ele já estava de pé.
- Volto em menos de um minuto Anne. – disse ele sorrindo.
- Não, - disse me levantando – eu vou com você.
Ele pareceu se divertir com isso.
- Por que isso agora?
- Curiosidade. – fui sincera.
Ele gargalhou musicalmente.
- E então vamos? – enxuguei as lagrimas do meu rosto com o casaco que Matt me dera. Senti seu cheiro, e me lembrei de como havia me comportado com ele. Queria me desculpar da maneira que lidei com ele. Matt talvez entendesse que eu não estava em um momento bom, acabara de descobrir que vampiros existiam. E que eu estava numa casa lotada deles.Vampiros? Nossa, isso parecia tão, ok, não havia uma explicação lógica para tudo.
Eu agarrei em seu braço e saímos juntos da sala. Assim como nas outras vezes, ao perceberem a minha presença no local, todos pararam o que estavam fazendo. Olhei com curiosidade para todos os presentes ali. Tentei memorizar cada rosto. Sam me levou para uma porta, embaixo das escadas. Entrando no local, era claro que ali era a cozinha da casa. Era enorme o local, mas parecia pouco usado. Era meio óbvio o porquê.
- E então o que quer comer? – perguntou Sam, amarrando o avental na cintura.
- Qualquer coisa. – disse sentando na bancada perto do fogão.
- Vou fazer, minha especialidade está bem? – disse sorrindo
Assenti com a cabeça. O silencio tomava o local, e assim ficou por um bom tempo, enquanto Sam acrescentava ingrediente e mexia. Eu tinha tantas perguntas a fazer.
- E então, que gosto tem sangue? – disse fazendo uma cara de nojo.
Ele não pareceu surpreso com a pergunta, provavelmente estava dentro da minha cabeça, enquanto eu pensava em como perguntar.
- Sangue animal tem mais graça para nós. – disse ele, mexendo na panela.
- Nada de sangue humano?
- Não para nós. – disse ele me entregando um prato. Parecia apetitoso, aparentava ser macarrão com carne, mas preparado de forma diferente.
- Como assim não para vocês? - disse dando a primeira garfada. Estava realmente delicioso.
- Existe outra coisa que você tem que saber. – disse ele se sentando do outro lado do balcão, de maneira que ficássemos olho a olho novamente.
Droga, mais coisa? Eu já estava bastante confusa com o que ouvira até agora e ainda havia mais coisa? Mas a curiosidade mais uma vez me venceu.
- Não somos os únicos, existe outra raça, semelhante a nossa. A única diferença entre nós é a alimentação. – disse ele devagar.
Consegui entender aonde ele queria chegar. Existia então dois tipos de vampiros, eles que se alimentavam de animal e outros, esses sim se alimentavam de sangue humano. Sam percebeu que eu entendi o que ele quis dizer, e logo me tranqüilizou.
- Não se preocupe com isso Anne, não há lugar mais seguro para você, do que aqui, ao meu lado.
Realmente, eu me sentia segura perto dele. Continuei comendo em silencio e ao terminar, fui em direção a pia com intenção de lavar meu prato como era de costume em minha casa. Ou na minha ex-casa. Eu estava ligando a pia, quando a mão de Sam segurou a minha.
- Você só pode estar de brincadeira não é? – disse ele sorrindo – Deixa esse prato ai. Vamos, você precisa descansar.
- Me deixa lavar o prato Sam. É o mínimo que eu posso fazer. – disse insistindo em ligar a torneira.
- Sente ali Anne, tem algo que você precisa saber. – ele parecia mais severo.
- Mais coisas? – eu estava farta de revelações. Mas talvez fosse melhor saber tudo de uma vez.
- Quando te contei a historia de onde tudo começou. A história de nossos pais. Mencionei que eles eram de mundos diferentes.
“Os mundos que eu me referia eram esses, o de nossa mãe, representa esse que hoje estamos. Todos que estão aqui. O outro mundo são aqueles que eu mencionei se alimentarem de sangue humano. O mundo onde nosso pai fazia parte, o mesmo mundo que aqueles que estiveram em sua casa mais cedo, faz parte.”
Então meu pai sim, ele se alimentava de sangue humano. Um arrepio passou por todo meu corpo ao pensar em quantas pessoas, meu pai poderia ter matado.
- Eu quero chegar a um ponto importante Anne. – continuou Sam. – De manha, você se perguntou o porque eu mandava e desmandava em Matt, o por que eu consegui levá-lo para longe de você.
Acontecera mais cedo, mas eram tantas coisas juntas, que pareceu ter ocorrido a tempos. Eu tinha discutido com Sam, pelo fato de ter tirado Matt de mim. Assenti com a cabeça para que ele continuasse.
- Cada uma dessas raças, tem um governante. Como se fosse um rei, alguém que possa representar todos.
“Aquele homem, nosso tio, é o que governa o outro lado. E quem governa aqui é ...’’
Ele deixou que eu terminasse a frase, que fosse muito óbvio o que ele tentava dizer. O primeiro nome que veio em minha cabeça era Michael, pela forma em que todos o obedeciam.
- Michael? – eu não podia afirmar ao certo.
Ele olhou frustrado para mim, então a resposta era tão obvia? Tentei raciocinar melhor, mas somente Michael me parecia alguém que comandasse aquele lugar.
- Não está tão claro Anne? – continuou ele, seu rosto mostrava que eu havia deixado algo passar – Se o trono um dia fora de nossos avos, pela lei de sucessão...
A resposta veio em minha mente instantaneamente e eu me senti extremamente burra em não ter percebido antes. Era Sam o governante deste mundo. Então...
- Ou... Ou... Ou. – não consegui por em ordem meus pensamentos para expressa-los.
Ele parecia tentar me ler, agradeci por sua habilidade, eu com certeza não ia conseguir pronunciar o que pensava. Ele assentiu com a cabeça, provavelmente esperando uma reação histérica de minha parte. Eu Anne, princesa (ao que me parecia), de um bando de vampiros.
- Nossa mais alguma coisa a declarar? Eu to falando serio, se tem mais alguma coisa a me contar, diga agora, prefiro ouvir tudo de uma vez. – disse me embolando com as palavras.
- Por hora é isso Anne.
No momento em que ele terminou de falar, ouvi um barulho, vindo da porta de entrada da cozinha. Num movimento rápido, Pablo, o vampiro grandalhão e loiro estava ao lado de Sam me olhando com curiosidade.
- Recado dado, pode se retirar. – disse Sam grosseiramente.
Pablo não havia dito uma palavra se quer, e o recado já estava dado. Ri com essa situação, teria que me acostumar em ter um irmão leitor de mentes por perto.
- Não. – disse Sam aleatoriamente, olhando para Pablo.
- É com ela com quem vou falar. – ele rebateu.
Ele se virou e ficou cara a cara comigo, Sam bufou e disse algo que não compreendi.
- Acho que tem alguém lá fora, que precisa de companhia. – disse ele docemente.
Não entendi ao certo o que ele quis dizer. Levantei sem pensar, eu não era muito boa em controlar minha curiosidade. Olhei em direção a porta, esperando que Sam me autoriza-se a ir. Era engraçado a forma que me tornei dependente dele em pouco tempo, a cada segundo, a sensação de conhecê-lo a minha vida toda se tornava maior, eu não precisava de nenhum exame que comprovasse nosso parentesco, meu coração já afirmava sua veracidade.
- É perigoso. – disse Sam.
- Qual é Sam? Acha mesmo que eles vão tentar alguma coisa com tantos de nós aqui? – disse Pablo, tentando convencê-lo.
Eu estava curiosa, queria saber quem me esperava.
- Pelo menos até a porta. – cedeu Sam. Um sorriso de satisfação tomou conta do rosto de Pablo.
Eu me agarrei a ele, e saímos juntos da cozinha. Pablo estava logo atrás de nós. Sam me levou até a porta e abriu-a.
A lua já tomava o céu que se tornou escuridão. As estrelas pareciam formar um cordão de brilhantes no breu. Sentado em um banco, ao lado do casarão estava Matt. Mesmo de longe, percebi que sua beleza se tornara mais intensa a luz da lua. Vacilei ao dar o primeiro passo, a temperatura, no lado de fora estava extremamente gélida, o vento frio tocou o meu rosto e estremeci. Olhei para Sam que já havia retirado seu casaco e sinalizava para que eu o pegasse.
- Mas e você? – perguntei antes de pegar.
Ele apenas riu, e colocou o casaco em minhas mãos. Senti-me extremamente quente e confortável ao vesti-lo. Ele possuía o mesmo cheiro que havia no agasalho que Matt me dera. Puxei o capuz para proteger minhas orelhas do frio. Fui andando desajeitada até Matt, que olhava profundamente em direção a floresta que cercava o local. Eu deveria estar completamente idiota, parecendo um urso com tantas camadas de proteção.
Ele pareceu indiferente a minha chegada, continuou olhando pra onde olhava. Nem sequer desviou o olhar para mim. Ele parecia realmente mal com que eu havia dito. Sentei ao lado dele, esperando que dissesse alguma coisa.