quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Capitulo Dezoito - Vampiros?

A luz alaranjada vindo da janela me alertou que já era tarde. Levantei rapidamente, olhando em volta, tentando me lembrar como viera parar ali. Já não estava no quarto de Sam, as paredes verdes não me deixavam mentir. Uma onda de tristeza começou a me engolir, tentei me prender as lembranças boas tentando diminuir o nó que teimava em aumentar.

Meus pés me levaram inconscientemente para o banheiro. No espelho notei que ainda usava as roupas de ontem a noite. Minha blusa estava manchada de sangue, eu a tirei rápido, com uma agressividade desnecessária. De novo, reparei na diferença do meu rosto, reparando novamente no brilho que parecia deslocado. A irritação em meu pescoço parecia cada vez melhor, tornando se agora um leve avermelhado, quase imperceptível. Tomei um banho rápido, tentando pensar o menos possível em tudo que aconteceu.

- Você acordou! – a voz de Pablo cortou o silencio que se fazia no hall. Seu sorriso era de um certo modo contagiante, não pude deixar de retribuí-lo.

Notei que a não ser por Pablo e Michael a sala estava vazia. Varias caixas de papelão deixavam quase impossível se locomover ali.

- Onde está Sam? - minha voz ecoou pela casa vazia.

- Sam... - Pablo começou a falar, mas parou no meio da frase, olhando para Michael.

- Ele está numa excursão de caça. – falou Michael despreocupadamente, mas pude ver seu olhar em mim esperando que eu surtasse, ou algo do tipo.

- Ah! – tentei passar um ar de despreocupada que pareceu funcionar. Michael voltou a fazer anotações em uma prancheta. – E Matt? – disse, tímida.

-Foi também. – respondeu Pablo.

Senti meu estomago roncar. Não me lembrava a ultima vez em que havia consumido algum alimento. Levei minha mão automaticamente a barriga, o ato não passou despercebido por Michael.

- Oh, que falta a minha, você deve estar faminta Anne. – ele já estava ao meu lado num piscar de olhos, fazendo alguns papeis voarem em sua passagem.

Michael me levou até a cozinha, e ainda em silencio, colocou algo no forno. Ele me passava um tipo de segurança que era muito bom pro momento que eu estava passando. As várias possibilidades de futuro se resumiam em uma, permanecer com eles. Não demorou muito pra que ele me entrega-se um prato que pelo o que me pareceu era lasanha. A comida em meu estomago foi um alívio. Michael sentou na minha frente e me olhava pacientemente, eu sabia que ele queria falar algo comigo, eu simplesmente sentia.

- Sam me proibiu de falar isso com você. – Michael começou assim que dei a última garfada. Meu coração acelerou de forma desastrosa. – Temos pouco tempo antes que ele volte.

Eu esperei atenta, pra o que ele queria dizer, a curiosidade novamente latejando.

- Você se sente diferente? De alguma forma?

- Na verdade não. Foi somente naquele momento que eu senti algo diferente. – eu procurava lembrar como se respirar. – Foi horrível. Só de pensar, eu... Eu. – minha voz falhou e senti uma lagrima escorrer.

- Eu sei como você se sente. É terrível na primeira vez. Principalmente do modo que aconteceu com você. – ele parecia sincero – Sam te contou a diferença entre nós e eles?

Minha voz parecia travada na garganta, o máximo que pude fazer, foi balançar a cabeça afirmando.

- Mas provavelmente não contou a principal parte. Não é quem te mordeu, ou o sangue que corre em suas veias que faz de você, um de nós, ou um deles. São as suas escolhas.

- Então, vocês são todos de uma mesma raça, mas as suas escolhas que fazem a diferença entre vocês? – minha voz parecia mais firme.

- Isso mesmo. – ele parecia contente por eu ter entendido, como um professor que fica feliz por um ‘10’ de um aluno.

- Me responde uma pergunta?

- Claro, Anne.

- Como... Como seria pra eu virar uma de vocês? Completamente é claro. – acrescentei.

- Bom... – ele parecia procurar as palavras certas. – É através do contato com o sangue de nossa espécie. Primeiro, mordemos a pessoa, de uma forma que nosso sangue possa penetrar mais em seu corpo, depois de alguma forma fazemos nosso sangue pingar. É um processo doloroso, tanto na mordida, quanto quando o nosso sangue começa a modificar o corpo da pessoa. Você tem que estar muito certo do que quer. Uma vez que começa o processo, não se tem como voltar atrás.

Eu parecia ter saído daquela sala. Minha mente estava a mil naquele momento. Era isso que eu realmente queria? Sim. Eu queria viver com meu irmão, queria ter Matt para mim, mesmo que doesse, era um preço justo a se pagar.

- Anne? – a voz de Michael quebrara minha tagarelice mental. - Não fale nada dessa conversa a Sam, por favor.

Antes que eu pudesse responder, a porta da cozinha abriu. Era Sam. Seu rosto parecia mais suave, e seus olhos mais verdes do que nunca. Ele abriu um sorriso assim que me viu, o que serviu como um grande alívio para mim, não agüentaria vê-lo como estava de manhã.

- Achei que ia dormir direto. – ele me abraçou pelas costas.

- Dormi demais.

- Ah, antes que eu me esqueça Anne, Louise vai te dar algumas instruções para amanha, sabe, pra passar pelas fiscalizações.

No instante que ele falou, a vampira entrou na cozinha de mãos dadas a Pablo.

- Vamos partir amanha cedo. Alguns ficarão e cuidaram da casa por algum tempo até ter certeza que nada ficou para trás, e depois se juntarão a nós. – eu sabia que Sam estava não falando só para mim, mas comunicando a todos. Percebi que seu tom de voz mudara, e se tornou mais superior.

Ficamos um tempo conversando, bom na verdade eu fiquei calada observando a conversa de fora. Sam não desgrudou um segundo de mim, ele ainda me abraçava pela cintura. De vez em quando, sentia seus lábios no topo da minha cabeça. Eu começava a sentir frio, mas achei que seria uma grosseria falar, talvez o magoasse.

Minha mente ficou vagando pelas coisas que Michael me dissera, principalmente como ele descrevera a dor que se sentia durante a transformação. Quem faria aquele ato final? Sam? Matt? Ah Matt, me perguntei onde ele estaria naquele momento já que Sam já havia voltado.

- É melhor eu te levar pra cama Anne, amanha vamos acordar cedo. – Sam se afastou pela primeira vez de mim, e notei que as nossas mãos estavam entrelaçadas.

- Mas eu dormi a tarde toda. – tentei argumentar. Eu estava me sentindo bem ali, era como se estivesse... Em família.

- Preciso arrumar algumas coisas Anne, a não ser que queira ficar sozinha. – eu estava começando a pensar na opção, quando uma voz fez meu coração acelerar.

- Ela não precisa ficar sozinha. – seu rosto trazia um sorriso perfeito, ele parecia mais relaxado como Sam. Eu fiquei tão presa aos seus olhos, que demorei a notar que Matt estava sem camisa. Ok, aquilo não fez nada bem ao meu coração. Respire Anne.

Sam olhava hesitante para Matt, me perguntei se ele estava lendo sua mente pra ver suas intenções. Senti meu sangue fugir para o rosto.

- Quer ir com...

- Quero. – respondi antes de Sam terminar a frase.

Sam apertou minha mão com um pouco de força quando comecei a andar em direção a Matt. Eu reclamei, e ele pareceu mais relutante em me soltar. Ele me puxou mais em sua direção.

- Me solta. Agora. – minha voz começava a ficar histérica.

- Você, ARGH. – ele apontava para Matt com uma cara acusatória.

Eu não acreditei quando ouvi Matt rindo sonoramente perto da porta. Ninguém estava entendendo absolutamente nada além dos dois.

Sam me olhou com uma cara nada boa e correu em direção a porta, era perceptível que todos ali acharam que Sam iria bater em Matt, mas ao contrario, ele saiu porta afora.

- O que você mostrou pra ele? – algo me dizia que se tratava disso. Andei em direção a Matt e parei de braços cruzados o encarando.

- Qual é Anne, vai ficar brava...

- O que você mostrou pra ele? – o interrompi e fiz questão de destacar cada palavra.

-Pensei na gente se beijando ontem. – ele falou baixo, mas eu tinha certeza que os três vampiros parados confusos do outro lado da cozinha haviam escutado. Prova disso foi a gargalhada sonora de Pablo e os risinhos baixos de Michael. A única que permaneceu quieta foi Louise.

- Você sabe como ele é. – tentei demonstrar o máximo de raiva em minha voz, meu rosto formigando.

- Foi sem querer. Eu simplesmente pensei certo? Ninguém mandou ele ficar xeretando minha mente.

Eu ignorei sua justificativa e assim como Sam, sai da cozinha as pressas. Me perguntei onde ele estava, e fui logo respondida por um forte estrondo no andar de cima. Corri antes que pudesse fazer mais estragos com seu acesso de ciúmes.

- Posso entrar? – não precisei bater na porta, tinha toda certeza que ele sabia que eu estava ali.

- Droga. Entra.

Meus olhos logo foram procurando o que causou o grande estrondo, assim que encontrei o que causara desviei imediatamente o olhar. Metade de seu guarda roupa estava quebrado, com uma mesa, que claramente não estava ali antes, em pedaços.

- Você deve ter algum problema só pode. – não consegui frear as palavras antes que elas saíssem e meu tom debochado não ajudou muito.

- Eu vou matar ele. – Sam parecia realmente alterado.

- Não vai nada. Você primeiro vai se acalmar, depois vai ver o quanto bobo você está sendo. – eu andei em sua direção.

- Me promete que não vai chegar mais perto dele? – a voz de Sam parecia suplicante.

- Não vou te prometer nada, não adianta.

- Então eu vou matar ele. – ele parecia ainda mais infantil falando aquilo.

Fui andando debilmente em sua direção tentando segura-lo, mas pra quem conseguiu quebrar uma mesa e um armário eu era inútil. Mesmo sabendo que ele não me machucaria, meu corpo tremeu quando consegui segura-lo.

- Se você machucar ele, eu vou sofrer. Quer me ver sofrer Sam? – era obvio que eu conseguira tocar no seu ponto fraco. Eu. Seu corpo se relaxou, ele sentou na cama.

- Droga.

- Vai se comportar? – disse passando a mão por seu ombro.

- Ele é um babaca.

- Não é nada. – soltei meus braços dos ombros dele, cruzando-os e olhando emburrada pra ele. Seu sorriso me fez crer que tudo já estava bem. – Te incomoda tanto, que eu... – senti o sangue subir novamente para o meu rosto. – Tenha beijado ele?

- Não. Me incomoda que seja ele.

O silencio novamente preenchendo o quarto. Voltei a minha discussão mental sobre o que aconteceria comigo mais a frente, demorando um pouco mais na questão da dor.

- Só faltava essa. – Sam levantou em um pulo, eu podia ouvir um rosnado saindo de seu peito. Ele olhava para a porta com uma expressão que fez meus músculos gelarem.

- Deixa eu entrar. – reconheci a voz que vinha de trás da porta, meu coração se apertou.

- Vai embora Matt. – minha voz saiu histérica.

- Não. – assim que ele falou, abriu a porta. Eu não sabia para quem olhar, ele ou Sam. – Eu quero conversar com ele.

Os rosnados se tornaram mais altos e eu tinha medo do que Sam podia fazer.

- Não, ele vai te matar. Sai, agora.

- Ele vai ter que me ouvir. – Matt parecia ignorar as reações de Sam, mas eu era inteligente o bastante pra saber o quanto aquilo seria perigoso. – Por favor.

Aquelas últimas palavras pareciam deslocadas na situação. Sam pareceu relaxar um pouco.

- Você sabe o quanto é perigoso. – a voz de Sam parecia surpreendentemente calma.

- Prometo que faço de tudo pra me controlar. – Matt parecia suplicante.

Eu sabia que estava perdendo alguma coisa, esperei que algum deles me explicasse, mas continuaram a falar coisas sem sentido.

- É arriscado. Você sabe o que pode acontecer.

- Por favor. Por favor, Sam, nunca te pedi nada. Só preciso disso, você sabe o quanto... – seus olhos foram para mim – Eu a amo.

Respira Anne, respira. A conversa passou a ficar mais clara a partir dali.

- Por favor. – disse, fazendo uma grande força de desviar os olhos de Matt, para Sam.

Ele me olhou indeciso, por alguns segundo pude jurar que ele iria dizer não, mas seu rosto de repente pareceu derrotado. Eu podia sentir minha boca se curvando em um sorriso. Matt pareceu entender também e veio em minha direção. Suas mãos me apertando para mais perto dele.

- Ah, Não! Na minha frente não. – Sam foi em direção a porta, seu dedo apontando para Matt. – Olha garoto, só fiz isso pela Anne, que fique bem claro. E, um arranhão, uma mancha roxa que for... Você ta morto.

Tentei disfarçar uma risada tossindo. Sam já estava se virando quando Matt o chamou.

- Sam?

Ele não respondeu.

- Só queria dizer obrigado, é serio. – Matt parecia sincero, ele me apertou mais junto dele.

- Vai pra merda. – disse Sam, saindo.

Dessa vez não consegui disfarçar meu riso, Matt ria também. Coloquei minha mão junto à dele.

- Agora, você pra cama. – sua voz tinha um tom de deboche. Me soltei de seu abraço apertado e o encarei de frente, cruzando os braços.

- Ta de brincadeira não é?

- Não mesmo. Amanha você vai acordar cedo demais, Sam pretende partir assim que a senhorita acordar. Vamos, te levo até o quarto.

Ele só podia estar brincando. AH, garotos já eram difíceis de entender, agora garotos vampiros eram demais pra mim. Senti seus lábios em minha testa me fazendo estremecer.

- Vamos Anne. Temos todo o tempo do mundo quando chegarmos lá, mas agora você precisa descansar. – Era possível que eu conseguisse negar algo a ele? Droga.

- Se eu falar que eu não estou cansada, você muda de opinião? – tentei argumentar.

- Não. Vamos, já te disse, temos todo o tempo do mundo. – ele sorriu maliciosamente, considerei aquilo um ponto final pra nossa discussão. E claro, o fim dos dias em que meu coração batia normalmente.

Eu me revirava na cama diversas vezes procurando arrumar um jeito que eu adormecesse. Não sabia o que ao certo causara essa insônia repentina, ansiedade, medo de cair novamente em meus pesadelos, ou as perguntas que ainda perturbavam minha mente. Tentei até contar carneirinhos, mas nos trezentos e noventa e três, eu notara que aquilo não estava surtindo efeito algum, pelo contrario, aquilo me deixava mais angustiada. Os primeiros passarinhos começaram a cantar na floresta e eu sabia que logo o dia estaria começando.

Desisti de tentar adormecer e fui até a janela, puxando uma cadeira para me sentar. Eu olhava para escuridão esperando achar respostas. Na minha cabeça se passava vários flashbacks de um passado que me parecia cada vez mais distante. Lembrei do meu aniversario de cinco anos, em que ganhei uns patins de uma tia que nunca vira na vida. Minha mãe surtou de vez, dizendo que aquilo não era coisa pra menina de cinco anos e o escondeu. Fui achá-lo alguns anos mais tarde, no porão, dentro de uma caixa velha. Achei que seria fácil tentar andar e acabei rolando pela rua. A imagem da minha mãe gritando comigo, me chamando de louca e malcriada, fez meu coração doer. Por que tinha que ser assim? Não pude nem me despedir dos dois.

Passei a procurar as novas lembranças, do meu passado recente. A primeira vez que vira dos dois. O dia em que Sam me levou na praia, quando ele disse que me amava, e o quanto ele pareceu feliz quando eu disse o mesmo. Eu o amava mesmo. Mesmo não passando boa parte de minha vida junto a ele, eu me sentia como se tivesse crescido ao seu lado. Minha mente voou para o dia em que fui até a casa de Sam, a história que ele me contou. A história da minha verdadeira família. Meus pais que morreram para me proteger.

Os primeiros vestígios do Sol começaram a aparecer no horizonte, tentei não pensar em nada. Só reparei que o tempo havia se passado, por que agora todo o céu tomara um tom de dourado diferente, e apesar de algumas nuvens o céu estava limpo. Eram raros dias assim, tão bonitos, em Foester.

Decidi que já era hora de levantar, tive a impressão de ouvir alguns barulhos no andar debaixo. O que eu não esperava era Matt apoiado na cômoda perto da porta, ele sorria para mim.

- Há quanto tempo está ai?

- Ouvi você arrastando a cadeira, e decidi ver se você estava bem. Você tava tão concentrada que não tive coragem de te interromper. – seu sorriso aumentando, ele veio em minha direção. – E então, como está se sentindo?

- Ansiosa e com um pouco de medo, admito.

- Vai ficar tudo bem, garanto que você vai gostar de lá.

- O que demais lá? Quer dizer, por que lá?

Ele sorriu pra mim e beijou minha bochecha.

- Você vai ver. Vamos, vamos aproveitar suas ultimas horas aqui.

Ele entrelaçou nossos dedos e me levou até o andar debaixo. A casa estava tranqüila e silenciosa, a sala parecia mais organizada do que ontem à noite. As caixas agora empilhadas no canto norte.

Matt me levou até a clareira atrás da casa. As flores violetas tomavam todo o espaço. Ele se sentou numa sombra que a grande casa fazia no local, eu deitei ao seu lado, apoiando minha cabeça em suas pernas, ignorando o orvalho ainda presente nos gramados umedecendo minhas roupas. Fechei os olhos sentindo o sol em meu rosto. A sensação era boa.

- Matt ?

- Sim Anne.

- O que nós somos? – a pergunta saiu da minha boca antes que eu arrumasse freios para ela.

Ele permaneceu em silencio por alguns segundos, o que pareciam horas. Meu coração batendo a mil.

- Vampiros? – eu sabia que ele estava se fazendo de desentendido.

- Não se faça de bobo.

- Bom, acho que namorados não? – ele me beijou na testa e correu para o meio das flores.

Respira, inspira. Respira, inspira. É fácil Anne, vamos lá. Respira. Lembrar de como usar minhas pernas pareceu mais fácil. Comecei a correr inutilmente atrás dele pela clareira. Era obvio que se ele quisesse estar no Canadá nesse minuto ele já estaria. Ele fingiu se confundir e deixou que eu agarrasse sua blusa. Nós caímos juntos em meio às flores, seu rosto a centímetros do meu.

- E então, o que você acha da minha idéia? – ele sorria todo bobo para mim, seus braços flexionados evitando jogar o peso contra mim.

- Que idéia?

- Não se faça de boba. – disse ele, fazendo uma imitação da minha voz.

- Acho perfeita. – eu sabia que naquele momento eu deveria estar da cor de um tomate. Os olhos dele brilharam.

Eu mal havia lembrado como se respira, e seus lábios já estavam presos no meu. Eu podia sentir seu hálito doce. Se alguém pudesse parar o tempo, eu queria que fosse naquele momento. Eu não sabia ao certo o que eu estava sentindo, até por que acho que nenhuma palavra ainda inventada poderia fazer jus a esse sentimento.

- Droga. – eu pude ouvir Matt falando por baixo de sua respiração ofegante.

Eu já estava começando a pensar o que havia feito de errado, quando uma voz fez com que eu me assustasse.

- Vocês deram muita sorte de Sam ter me mandado vir te procurar. Quero nem pensar no que ele faria se encontrasse vocês dois, desse jeito. – Pablo parecia divertido com toda situação. Se eu pudesse me esconder dentro de um buraco, teria feito isso nesse exato momento. Pablo soltou uma gargalhada sonora.

- Vamos! Vocês dois. Chega de amasso.

Matt me ajudou a levantar. Notei que minhas roupas estavam todas sujas de terra. Tentei livrar-me de o máximo de sujeira com as mãos para ter que evitar uma futura explicação para Sam. Pablo já tinha entrado na casa.

Matt passou as mãos pela minha cintura e eu fiz o mesmo com ele. O sorriso em seu rosto mais radiante do que nunca. Era quase impossível acreditar que ele era meu... Namorado.

domingo, 9 de agosto de 2009

Capitulo Dezessete - Tatuagem

Pesadelo. Era tudo que esperava que tivesse acontecido. Só um pesadelo idiota. Mas ao contrario do que eu queria a noite passada, havia sido real. Cada instante daquela terrível noite estava gravado em minha mente como uma tatuagem. O desespero, o medo, o desejo. Esse último era o que mais me atormentava. Eu havia tido desejo por sangue. Não era algo que eu podia explicar, ia bem além do que eu conhecia. O sangue havia cantado para mim. Ok parece estranho, mas é a verdade. Era como se eu estivesse faminta há dias e aquele fosse um delicioso prato, ou se eu estivesse no meio do deserto e aquilo fosse uma lata de coca.
Meio humana, meio vampira. Eu vi o desespero nos olhos de Sam, quando aquele maldito contou sobre o que ele havia feito. Mas como? Como eu poderia ser meia vampira? Até noite passada, eu não havia manifestado nada em ser meia vampira. Argh. Eu era a aberração, no meio das aberrações.
Eu estava perdida em meus pensamentos quando ouvi um breve sussurro. Eu não conseguia identificar quem dissera, muito menos o que dissera. Mas procurando responder minhas perguntas, abri meus olhos. Demorei alguns segundos para me acostumar com a claridade ofuscante do Sol. Aos poucos uma silueta foi se tornando mais nítida.
Era Ele. O protagonista da única lembrança colorida da noite passada. Ele havia me beijado. O mero vislumbre da cena fazia meus lábios formigarem. Se não fosse pela sua respiração lenta, quase imperceptível, poderia jurar que ele era uma daquelas esculturas gregas antigas que eu via nos meus livros de historia. O contraste perfeito que vinha e sua pele branca e seus cabelos negros era o que mais se sobressaía. Não conseguia encontrar um erro se quer nele. Eu podia ficar ali, por horas, possivelmente dias, admirando seu rosto, mas eu sabia que teria que enfrentar as conseqüências da noite de ontem. E sabia que elas não seriam fáceis.
Fiz um enorme esforço para me levantar. Meu corpo parecia ter sido enxertado com chumbo, e minhas pernas não pareciam agüentar o peso, nem realizar o esforço necessário para me mover. Mas eu só precisava andar alguns passos para chegar ao seu lado. Tentei fazer o mínimo de barulho ao me sentar, em vão claro.
A paisagem não mudara, mesmo que para mim, desde a última vez que eu havia estado aqui, parecia ter se passado anos. As flores amarelas, que ele me mostrara, estavam mais amarelas do que da ultima vez, e seu cheiro, doce e agradável, presente no ar. Não sei quanto tempo se passou, mas o silencio que se sucedia, era extremamente irritante. Desde essa mudança repentina de vida, o silêncio, que antigamente era meu melhor amigo e aliado, havia se tornado algo insuportável. Isso me fez pensar se não seria uma prova, de que mais coisas mudaram em mim.
Eu o olhava, na esperança que ele falasse algo. Sua testa agora enrugada, demonstrando preocupação. Eu não precisava dos dons de Sam para saber o que ele estava pensando.
- Eu sei, é terrivelmente estranho. – disse por fim.
Finalmente ele olhou em meus olhos. Fiquei perdida na imensidão verde de seu olhar. Eu pude ver o quanto ele estava preocupado.
- O que mais nos atormenta, é não termos percebido a diferença antes. – sua voz antes aveludada, estava rouca e sem vida. Eu entendi o plural da frase como ele e Sam.
- Não é tão ruim. Não é? – minha voz agora era um sussurro.
- Eu queria te dizer que sim. Queria te dizer que tudo vai ficar bem, que isso não é algo para se preocupar. Mas não tenho como te falar nada Anne. Nunca vimos algo igual. Não temos como tomar nada como padrão. – cada vez mais percebia o quanto ele estava desesperado. Ele desviou o olhar do meu.
- Quem estava aqui? – tentei mudar de assunto, antes que o nó em minha garganta torna-se a crescer e as lagrimas retornassem.
- Sam. Ele vem toda hora aqui, pra ver como você está.
- Ah! E ele não me levou para longe de você? – forcei um sorriso, mas pelo visto não me sai tão bem.
- A casa grande está maior bagunça. As perdas foram grandes. – ele pareceu se arrepender do que disse, no instante em que falou. Seus olhos encontraram mais uma vez os meus, e eu tentei me prender neles na esperança de não desabar em lagrimas novamente.
Eu sabia que as perdas que ele falara, não eram materiais. Mais gente havia morrido por causa de mim. Eu arfei procurando lembrar como se respirava. Ele segurou minha mão, tentando me acalmar. Aos poucos minha mente foi clareando.
- Desculpe. – ele segurou meu queixo de modo que ficássemos olho a olho.
- Desculpe você de que? Eu que tenho que pedir desculpas. Você não vê? Por onde eu passo eu levo tragédia. Meus pais, minha avó, agora mais gente. Eu sou uma maquina de trazer mortes. – minha voz agora se tornando histérica.
- Você sabe que isso não é verdade.
- Sem hipocrisia Matt. – mesmo sem querer acabei sendo rude com ele.
Levantei-me rapidamente e me apoiei na grade de madeira velha que cercava a pequena varanda. Respirei fundo, sentindo o aroma das flores, tentando me acalmar. Ele se levantou, e me abraçou pelas costas. Suas mãos em minha cintura, mesmo com o casaco podia sentir sua mão gélida como sempre. Eu apoiei minhas mãos em cima das dele, me acostumando com a temperatura.
- Fique calma. – ele sussurrou em meu ouvido. Eu tremi, e ele riu, mas eu sabia que por dentro ele ainda estava mal.
Eu estava olhando em direção da casa, quando vi um vulto vindo em nossa direção.
- O que? – minha voz estava falhando novamente, o desespero mais uma vez subindo.
- Ei, fica calma. É Sam. – ele disse nos meus ouvidos novamente e começou a se afastar de mim.
Forcei um beicinho, e ele sorriu maliciosamente para mim. Não pude deixar de rir, o que me fez sentir mais leve.
- Você acordou. – num piscar de olhos ele estava ali, seu rosto como o de Matt quando eu acordei.
- Quantos? – mesmo sabendo que a resposta iria me fazer mal, ultimamente eu entrei numa de ‘ Verdade mesmo que ela doa ‘. Ele olhou para Matt e revirou os olhos.
- Três.
Eu sabia que não conseguiria mais ficar em pé, então me adiantei até o sofá. O rosto de Matt voltando como estava minutos atrás. Os dois se entreolharam por um bom tempo. Eu empurrava cada vez mais o nó em minha garganta e fazia um esforço enorme para não deixar as lagrimas rolarem. Três. Eu causara mais três mortes. Um arrepio passou pela minha espinha.
- Temos que conversar algumas coisas Anne. Preciso de sua opinião. – o tom de voz de Sam, fez com que eu ficasse apavorada.
- Tudo bem. – tentei sem sucesso, passar confiança pela minha voz, mas ela mais uma vez, não passou de um sussurro.
Caminhamos nós três, juntos, lentamente pela trilha. Sam evitava olhar para mim. Não conseguia entender o por que. Será que ele estava com medo do que eu era? Arfei, tentando empurrar mais fundo o nó em minha garganta. Eu sabia que estávamos perto da grande casa, por que conseguia ver uma pequena movimentação, foi quando Sam parou. Ele e Matt se entreolharam mais uma vez.
- Eu preferiria que você não visse algumas coisas Anne. – disse Sam, mais uma vez evitando me olhar.
Eu não sabia muito que fazer. Então levei minhas mãos para o meu rosto de um modo infantil. Aconteceu tão rápido que eu não tive tempo de pensar direito. Eu mal havia fechado os olhos, quando senti o aperto em minha cintura e o vento forte chicotear meu rosto. Que só parou com o ‘click’ de uma porta se fechando. O cheiro irritante de álcool, me fez abrir os olhos. Se eu não soubesse que Sam estava me levando para a casa, eu poderia jurar que estava em um hospital, ou em um laboratório. Nós estávamos em uma pequena sala, toda branca e iluminada, cheia de equipamentos que eu não tinha a mínima noção para que servia. Matt não estava na pequena sala, mas nós não estávamos sozinhos. O mesmo medico que havia me examinado anteontem, estava no canto da sala, em uma escrivaninha fazendo algumas anotações. A ausência de Matt, fez com que o nó se tornasse ainda maior.
- Ele só foi resolver algo para mim. Já estará de volta. – eu sabia que ele estava falando comigo, mas ainda evitava olhar para mim.
Ele ficou um tempo ali, remexendo em uns papeis fingindo ter interesse, mas eu sabia que ele estava fazendo isso, pra evitar olhar para mim.
- Bem, precisamos conversar. – Sam começou.
- Você já disse isso.
- Então, nós precisamos fazer alguns exames, pra saber sobre... – sua voz falhou e finalmente ele olhou para mim. Naquele instante, eu sabia que não era o medo que o fazia evitar me olhar. Ele estava apavorado, talvez mais do que eu. Eu pude ver o misto de preocupação e pavor tão claramente pelo seu olhar, que me fez pensar como ele estaria por dentro.
Eu tentei pensar em coisas otimistas, na esperança de que ele estivesse me ‘ouvindo’. Mas seu olhar ainda preso no meu, não mudara. O medico se levantou e andou em minha direção. Sam olhou para ele, e acenou para que eu sentasse numa cadeira, perto da escrivaninha onde o medico estava. Estava me sentando quando reparei o que estava na mão do medico. Era uma daquelas seringas, que se usa para exames de sangue. Não pude deixar de soltar um gemido. Nunca me dei bem com agulhas.
- Não dói, é como se fosse... – o mesmo discurso bobo de todo medico, que eu já sabia de cor.
- Uma picadinha de mosquito. – tentei sorrir me mostrando confiante, mas parecia que meus músculos faciais estavam congelados.
Sendo sincera, realmente não dói. Meu desespero é algo mais psicológico. Nem Freud explicaria. Mal havia sentido a dor da picada, e ele já estava retirando a agulha e indo a direção a uma maquina branca. Sam sentou numa cadeira ao lado da minha. Eu encostei minha cabeça em seu ombro, tentando relaxar e pensar novamente em coisas otimistas.
- O corte no seu pescoço está doendo? – Sam perguntou.
Eu levei minha mão automaticamente até meu pescoço, onde ontem a noite, aquele maldito havia me cortado com aquele punhal. O corte não doía exatamente, mas ardia um pouco se fosse tocado.
- Só arde um pouco. Na verdade, eu nem lembraria dele, se você não tivesse me lembrado. – fui sincera.
Foi tão rápido que eu só pude ver um borrão. A imagem ficou mais nítida quando Sam parou na minha frente segurando algo branco e úmido em sua mão. Assim que eu respirei, pude saber que se tratava de algodão com álcool. Ele levantou meu queixo delicadamente e passou o algodão de leve. Eu choraminguei e automaticamente Sam parou de limpar o corte. Ele mal acabara de fazer o movimento, quando o medico levantou e andou em nossa direção com uma cara de ‘ não trago notícias boas ‘. Um arrepio passou pela minha espinha e Sam reparou. Ele se sentou novamente e entrelaçou os dedos deles com os meus.
- Eu realmente não sei o que dizer. – começou o medico – Isso é algo que eu nunca vi nesses meus 200 anos de vida. As células dela são divididas igualmente para cada espécie. É algo perturbadoramente fantástico.
- Eu não entendo como não vimos essa diferença antes. Leonard você tem alguma teoria de como isso pode acontecer? Como aquele cara conseguiu fazer isso com ela? – ele apertou de leve a minha mão. Eu olhava do medico para ele, e de ele para o medico, esperando talvez uma resposta que me tranqüilizasse.
- Foi o que te disse mais cedo Sam. Muitas coisas não terão respostas, não temos algo em que se basear. – ele olhou para mim, com aquele olhar de quem se pede desculpas.
- Teorias? – estimulou Sam.
- Talvez. Uma enorme transfusão de sangue seria a mais provável, mas mesmo assim, a teoria tem vários erros. Eu te disse Sam, não tenho muitas respostas.
- Transfusão de sangue? Como? Ele simplesmente trocou o sangue dela pelo o deles? – eu pude notar o ódio em sua voz.
- Teorias Sam, teorias. Caso essa esteja correta, essa transfusão ocorreu há muito tempo atrás, coisa de década. Isso explicaria o porque do cheiro do sangue estar tão camuflado.
- Talvez na época que ela ficou desaparecida. – ele olhou para mim. – A falha de dois anos entre a data que ela foi levada e o registro do orfanato.
Meus olhos se estreitaram e eu olhei para ele. Eu não sabia disso. Mas percebi que talvez houvesse muitas outras coisas que eu também não sabia.
- Pode ser. Me dê dois dias Sam. E eu posse te dar mais respostas. Nesse momento foi me dedicar a encontrar as características de cada espécie nela. – eu não gostava na palavra espécie, me deixava ainda mais apavorada.
- Como assim? – me intrometi pela primeira vez na conversa dos dois, provocando olhares de todas as partes.
- Bem. Como eu disse para o seu irmão Anne, eu não tenho muito que fazer. Mas acredito que essas células contribuam para a sua genética. Assim como você tem características humanas, provavelmente há algumas vampiras. Ontem à noite você demonstrou uma delas. – ele me olhou um pouco constrangido. Eu arfei com a lembrança. O desejo pelo sangue. – Eu posso voltar a te chamar, mas por hora é isso. – ele sorriu timidamente e voltou para a máquina.
Eu sentia o nó aumentar a cada instante. Olhei para Sam na esperança de que ele falasse algo que viesse a me acalmar. Mas o silencio se arrastou por longos minutos. Sam ficava ali, olhando para minha mão com uma curiosidade forçada.
- Vamos. – Sam disse finalmente. Não durou uma fração de segundo o alivio que passou pelo meu corpo quando ele se levantou e apontou com a cabeça para a porta, a expressão que tomou seu rosto me fez tremer.

O quarto de Sam mudara bastante desde a última vez que estive nele. Mudara pelo fato de agora estar tomado de malas e varias caixas de papelão.
- Pra onde você vai? – minha voz saiu mais histérica do que eu esperava.
- Pra onde nós vamos é a pergunta correta. Era isso que eu queria conversar com você. – ele apontou para a cama, ou melhor, pro pequeno espaço vazio que restava. Eu esperei que ele continuasse.
- Não podemos continuar aqui. – sua voz subiu alguns tons. – Não é mais seguro. Além de que, estamos muito perto da cidade, e a policia já chegou muito perto daqui nas ultimas horas. Em cada canto da cidade há um cartaz com sua foto Anne, e Matt e eu, estamos na lista dos principais suspeitos. – eu ouvi cada palavra tentando entendê-las.
Então meus pais não haviam desistido de mim. De alguma forma eu já sabia disso. Eles me amavam muito. Mesmo depois de tudo o que aconteceu e de tudo o que eu descobri, eu sabia que também os amava demais. Eu tentei, sem sucesso, esconder a dor que me tomou. Eu abracei meus joelhos procurando um abrigo. Só não entendia o porque de Sam e Matt, serem suspeitos de meu seqüestro, ou desaparecimento como eu preferia chamar.
- A sua ligação para Matt. – começou Sam, provavelmente tendo lido minha pergunta. – Seu celular caiu no quarto lembra? Eles conseguiram rastrear sua ligação e deu no celular de Matt. Eles logo desconfiaram que ele podia estar ligado a tudo.
Eu tentava me lembrar de como respirar. Ainda não entendia onde Sam de encaixava na historia.
- Eles ligaram as coisas Anne. – disse Sam, respondendo a minha pergunta mental – Primeiro, eu e Matt, nos matriculamos na escola, como se fossemos irmãos. Pense, primeiro o seu desaparecimento e sua ligação para Matt, que para todos os efeitos era meu irmão. E logo depois, eu e Matt desaparecemos da escola e de nossa casa na costa.
Não demorou muito tempo para que o sentimento de culpa voltar a tona, agora por minha causa, Sam e Matt eram foragidos. O nó parecia aumentar cada vez mais, e eu fazia um grande esforço para respirar. Sam me olhava de uma forma estranha, algo que eu não podia entender. Eu tentava ao máximo esconder meu sofrimento, mas cada vez parecia menos possível.
- Vamos partir amanha cedo Anne, se você estiver de acordo. – ele veio andando em minha direção.
- Claro. – minha voz não passou de um breve sussurro. Tentei não pensar muito antes de responder. – Mas vamos para onde?
- Saint-Mandé, França. – ele estava a um passo de mim.
Demorei um tempo pra digerir as palavras. França. Era tão longe daqui. Mesmo sabendo, que alguma hora teria que me desligar do meu passado, permanecer em Foester me deixava mais em casa. Havia sido aqui que eu cresci. Mas eu precisava esquecer. Tinha que me adaptar as novas regras. Com um surto de otimismo respirei fundo.
- Tudo bem, amanha partiremos. – tentei passar confiança em minha voz.
Ele se ajoelhou, ficando olho a olho comigo. Eu podia ver que ele estava sofrendo, e isso me fazia sentir um lixo. Eu criara em pouco tempo um laço fraternal imenso com Sam. Ver ele sofrer, me fazia sofrer.
- Eu te prometo Anne, que eu vou conseguir resolver esse problema. Eu vou fazer de tudo, nem que eu tenha que morrer por isso. – eu podia sentir a lealdade em sua voz. Eu senti a dor passar pelo meu corpo, quando ele disse as ultimas palavras. Ele era a minha família, eu só tinha a ele. Eu pude sentir as primeiras lágrimas escorrerem pelo meu rosto. O nó estava me sufocando e a sensação de um vazio dentro de mim, me atingiu novamente.
Eu me joguei em seus braços procurando um abrigo. Ele me abraçou com força e pude sentir que ele também chorava.
- Por favor Sam, nunca me deixe, por favor. Você é tudo o que tenho. – consegui falar em meio aos soluços, mas minha voz não passou de um sussurro. Ele me abraçou ainda mais forte.
- Eu vou estar sempre com você, até o final. – sua voz estava rouca.
Nós ficamos ali, não sei por quanto tempo. Podia ter sido dois minutos, ou duas horas, mas de alguma forma, em meio aquilo tudo, em meio aquele pesadelo horrível, eu me senti inteira. Eu sabia que ele não me abandonaria.
Eu tinha tomado uma decisão de esquecer o meu passado. Esquecer de tudo o que pertencia a ele. Meus pais adotivos, meus amigos, tudo. Mas eu tinha a consciência de que não seria fácil essa mudança. A dor que eu sentia só de pensar em abandonar tudo era uma prova disso. Mas era necessário. Não conseguiria virar a pagina, se ainda fosse presa pela anterior. Eu precisava de Sam para conseguir passar por isso tudo.
Muitas perguntas estavam em minha mente. Por que tínhamos que ir para França? Lá havia algo maior? E escola, eu não freqüentaria mais? Minha mente vagou até Marina. Será que ela estaria bem? E minha visão da noite anterior? – um arrepio passou pelo meu corpo só de lembrar – Ela havia sido forjada pelo maldito do meu tio?
Eu precisava de respostas. Mas agora, não. Agora eu queria ficar ali, ouvindo a respiração de Sam, me sentindo completa.