domingo, 28 de junho de 2009

Capitulo Quinze - Irmandade

Mesmo com o sol, o clima estava frio, principalmente dentro da floresta. Os poucos raios solares que conseguiam se infiltrarem pela densa camada de arvores, não servia de nada. O que parecia mais irônico era Sam, ao meu lado, usando somente uma calça de moletom.
- Você não sente frio não? – tentei ser o mais indiferente possível, ainda estava brava com Sam pelo jeito que ele tratava Matt.
- Não. – ele ainda parecia raivoso.
Não fiz questão de continuar a conversa. Se ele quisesse me tratar daquela forma, o problema era dele.
- Não é bem assim Anne. É que me incomoda te ver com aquele moleque. – sua voz parecia mais suave.
Ele riu e me abraçou. Eu ainda estava brava com ele, mas retribui o abraço.
- Descobriu alguma coisa sobre o que eu te mostrei? – continuamos andando pela trilha, eu já conseguia ver de longe a grande casa e a movimentação em torno dela.
- Não muita coisa, é realmente estranho isso. – ele parecia distante.
Como se não bastasse, mais alguma coisa estranha na minha vida. Talvez eu tivesse passado um dia muito estressante e aquele sonho tivesse sido um reflexo de tudo que passei.
Fiz de tudo para olhar o menos possível para todos que estavam ali, sabiam que todos os olhares eram para mim e Sam. Fomos direto para o escritório que Sam me levara ontem. Michael nos esperava lá.
- Boa tarde Anne. – olhei de relance para o relógio, eram quase duas da tarde.
Acenei com a cabeça e me sentei no sofá. Aquele lugar não me trazia boas lembranças. Descobri lá, boa parte das mentiras que eu vivi.
- Anne, antes de tudo queria te perguntar, esses sonhos, são freqüentes? – Sam perguntou.
- Se tornaram mais freqüentes recentemente, mas às vezes, como hoje, e ontem na sua casa – olhei para Sam – primeiro vem uma dor de cabeça muito forte e depois, é como se eu entrasse de novo nesses sonhos.
Michael e Sam se entreolharam.
- Eu vi o de ontem, na minha casa, foi estranho por que aquilo me parecia algo muito antigo, algo do dia... Que tudo aconteceu.
A tranqüilidade aparente no rosto de Michael foi quebrada com uma ruga de preocupação que surgiu na sua testa.
- Sam me contou, que você ‘assiste’ o que está acontecendo. – ele parecia procurar as palavras certas para usar- Não é você, Anne, que está lá, é como... – ele parou, me olhando intrigado.
- É como se eu estivesse no corpo de outra pessoa. – era ainda mais bizarro. Eu já sabia disto, aquele corpo era mais forte que o meu, e no sonho que tive essa noite, a julgar pelo reflexo no espelho, eu sabia de quem era. Eu tremi.
Sam e Michael estavam se olhando intensamente, como se pudessem se comunicar telepaticamente. Pensando em tudo o que aconteceu recentemente, isso não seria nada demais. Mais uma coisa bizarra, pro meu histórico.
- Na hora que eu estava com Matt – os olhos dos dois vieram instantaneamente para mim, Sam revirou os olhos, o ignorei. – A dor de cabeça voltou, e eu tive outro desse treco. – a palavra visão, me soava muito... Aberração.
Eles se entreolharam mais uma vez. Eles esperaram que eu continuasse.
- Foi estranho, por que dessa vez, não parecia ser o corpo de sempre. Ele era mais fraco. – eu tinha total convicção sobre isso. Sam veio em direção a mim, eu já sabia o que ele queria.
Ele segurou minhas mãos e aquilo me fez de alguma forma relaxar, eu me sentia bem perto de Sam. Fechei meus olhos tentando lembrar tudo o que eu tinha visto. Não precisei fazer muito esforço, a imagem da criança e da mulher estava presente na minha cabeça desde que as vi. Tentei me prender ao pouco que dava pra ser visto do rosto da mulher. Abri meus olhos e Sam estava concentrado me olhando intensamente. Ele olhou rapidamente para Michael e notei preocupação em seu olhar.
- Era Nicole. Eu tenho certeza. – Sam se embolou com as palavras ditas muito rapidamente.
- Quem é Nicole? – parecia que um balde de água gelada havia sido jogado nos dois.
- É impossível Sam. Nicole morreu faz 13 anos. – disse Michael, visivelmente perturbado.
- E se ela não tiver morrido? – o rosto de Sam não estava muito diferente do de Michael.
- Impossível. Eu vi o corpo dela. – Michael parecia convicto.
- Alô?! Eu estou aqui. Alguém pode me explicar quem era essa Nicole? – por um instante pensei que eles realmente não haviam reparado minha presença, por que eles me olharam espantados. Mas Sam sentou ao meu lado e começou a me explicar.
- Nicole era como se fosse uma espiã. Ela nos passava informações sobre o que Augustus tramava. Ela passou um tempo sem nos informar nada, isso foi logo depois daquele maldito ter te levado. – reparei que pela primeira vez, Sam, citara o nome de nosso tio. Augustus. Senti um arrepio ao ouvir seu nome.
- E se a Anne, não tivesse visto algo que vai acontecer, ou que esta acontecendo. Talvez ela estivesse vendo algo que já aconteceu. – o rosto de Michael parecia mais esclarecido. Bizarro. Ainda era muito bizarro.
- Pode ser isso mesmo. Na minha casa, ontem, ela pareceu ver o que tinha acontecido naquele dia.
- E isso é comum? Quero dizer, tem gente que vê coisas. Gente como vocês. – ok, admito que não conseguia pronunciar a palavra vampiros.
- Eu nunca havia visto algo desse tipo Anne. – Sam falou. Sua voz trazia um traço de orgulho ou algo do tipo.
- Nem eu. – achei que Michael poderia me salvar, ele parecia mais experiente, mas infelizmente não foi o caso. A palavra aberração ecoava em minha mente.
- Mas você Sam, seu dom. É comum entre vocês?
- Também não Anne. Acho que esse lance de um raio só cai em um lugar uma vez, não vale para nós. – Sam riu divertido, pra não deixá-lo mal, ri também, mas não vendo nenhum humor na situação.
- Não é tão comum para os vampiros terem esses dons especiais, é bem raro por sinal. – Michael ainda estava com a preocupação presente em seu rosto. – Então, é só Anne. Já está tarde e eu acho que você deve estar com fome. Sam vai te dar seu almoço. Só quero que me prometa uma coisa. Caso você tenha mais alguma dessas visões, peço que procure Sam ou eu imediatamente.
- Eu prometo. – dei um meio sorriso para ele. Em um piscar de olhos, Michael não estava mais ali. Se eu não ouvisse a porta se fechando de leve, juraria que ele havia se tele transportado.
- Velocidade é um dom que temos. Todos nós. – Sam provavelmente estava na minha cabeça novamente.
O silencio atingiu o local enquanto eu digeria mais uma característica deles. Drácula de Bram Stoker era fichinha perto de tudo isso. Meus pais me deram o livro no Natal passado. Só coincidência? Ou realmente eles sabiam de algo dessa loucura de vampiros.
- Não. – Sam interrompeu minha conversa interior. Na minha mente, de novo.
- Droga Sam, o lance de ler minha mente, é só quando eu pedir. Continuemos naquele mesmo esquema. Ignore a minha mente, que eu fico feliz. – minha voz saiu severa demais, mas realmente esta situação toda não me deixava muito contente.
- Desculpe. – seu olhar era sincero. – Você realmente me deixa intrigado. Não sabe a força que faço para tentar te ler. Esse lance de radio fora de sintonia me deixa... Frustrado.
- Mas então, eles realmente não sabiam de nada? – isso não fazia ficar melhor toda aquela situação que eu estava vivendo. Meus pais, ou melhor, aqueles que me criaram, tinham mentido o tempo todo para mim.
- Na verdade até pouco tempo, eu não sabia se você estava viva ou não. Algo dentro de mim tinha certeza que sim. – seu olhar estava vago. Ele pegou minha mão delicadamente e me fez levantar. – Vamos você já deveria ter almoçado.
Eu sabia que ele ia me contar alguma coisa. Então, não o questionei, nem nada. Ele me levou até a cozinha, meus dedos cruzados com o dele. Eu realmente me sentia bem ao lado dele, talvez fosse coisa de irmãos. Dei um meio sorriso a ele, mas ele parecia aéreo e não notou. No caminho até a cozinha, olhei para os lados, procurando Matt. Mas não o encontrei. Na cozinha, um prato do que me parecia peixe frito, me esperava. Eu não estava com muita fome, mas acabei comendo tudo. Estava realmente maravilhoso. Sam sentou na minha frente como fizera ontem à noite. Me observando silenciosamente enquanto comia. Notei que algumas vezes, seu rosto se tornava preocupado como se estivesse debatendo um conflito interior.
Depois, ele me levou até o andar de cima, onde ficavam os quartos e os banheiros, para que eu pudesse escovar meus dentes. Ele estava calado demais. De alguma forma isso me preocupava. Quando voltamos ao hall, a sala já estava cheia novamente. Não tão cheia quanto ontem, mas ainda tinha um numero considerável de pessoas, er... Vampiros. Sam me levou até perto de um pequeno grupo, que se localizava perto do lado norte do local. Uma grande janela de vidro mostrava a vista para um pequeno jardim. Sam logo mudou de expressão assim que chegamos mais perto do pequeno grupo. Ele finalmente estava sorrindo.
Um homem ruivo chamou a atenção dos que estavam ali, para a nossa aproximação.
- Ei cara, cadê a chave do meu bebezinho? – Sam pronunciou as palavras com uma pontada de orgulho.
O ruivo baixinho entregou uma chave grossa e dourada na mão de Sam.
- Seu motor está como estava antes. Só não tente chegar a mais de 200 por hora novamente está bem?! – a voz dele era rouca, mas mesmo assim aveludada. Os dois riram juntos.
- Vou fazer o possível. – a voz de Sam, desta vez trazia excitação. Ele me puxou, andando bem mais rápido do que antes.
Lá fora, percebi o que seria o ‘bebezinho’ de Sam. Ok, admito que em questão de carros eu era uma alienada. Mas não ao ponto de não reconhecer o símbolo da Ferrari no capo e nas rodas do carro. Era um carro lindo por sinal, o vermelho típico da Ferrari tingia o carro desde sua lataria até os bancos. Eu hesitei antes de entrar no carro. Sam já tinha ligado o motor que rugia sonoramente.
- Não vai entrar por que? – sua voz tons mais altos por causa do alto barulho.
- Vai mesmo cumprir a promessa de não passar de 200 não é? – eu tentei não soar tão infantil, mas foi em vão.
Ele riu puxando minha mão para que eu sentasse no banco. Assim que bati a porta, o casarão parecia se dissolver em meio a paisagem. O carro andava por uma estrada improvisada, e ele parecia andar cada vez mais rápido. Sam pareceu reparar na minha cara de assustada.
- Qual é Anne? Me diz a graça de se ter um carro assim, e andar no limite de velocidade? Além do mais, essa estrada fomos nós que criamos, então... Não tem limite. – um sorriso bobo em seu rosto. Ele parecia um menino feliz, que acabara de ganhar um carrinho de controle remoto dos pais. Só muda que o brinquedinho dele tem rodas cromadas, bancos de couro e um daqueles tubos de nitro. Ok, admito que aluguei Velozes e Furiosos vezes demais.
- Ninguém nunca achou aquela casa não? Ela não é nem um tanto pequena pra ser imperceptível. – o sorriso bobo aumentou quando perguntei.
- Na verdade ela foi encontrada bastantes vezes, mas sempre damos um jeito de manter o segredo, em segredo. – ele manteve o tom inocente, mas um arrepio passou pela minha espinha. Ele logo notou.
- A não. – ele deu um riso meio tímido. – Você entendeu errado. Vamos se dizer que todo humano tem seu preço pra manter a boca fechada.
Um alivio passou pelo meu corpo e eu relaxei.
- Estamos indo para onde? – tentei mudar de assunto.
- Você vai ver, estamos chegando. – ele pisou ainda mais no acelerador. De longe consegui ver o manto cinza que era o oceano.
Sam estacionou a poucos metros da areia. O clima ali parecia mais quente, mesmo com o vento forte batendo no rosto. Sam continuava apenas com a calça de moletom.
- Por que me trouxe aqui? – tirei os tênis para poder pisar na areia. Eu amava a sensação.
- Eu acho esse lugar fascinante. De alguma forma ele me faz esquecer tudo. – seu olhar estava vago.
Ele sentou na areia e eu o acompanhei.
- Foi Michael que te viu primeiro. – me virei para que ficasse frente a frente com ele. – Ele me ligou imediatamente. Eu estava na França, e peguei o primeiro avião para cá.
- Esse tempo todo, vocês não me procuraram? – minha voz saiu meio chorosa.
- Te procuramos por muito tempo Anne. Oferecemos imensas recompensas, mas pareceu que aquele maldito não queria que ninguém soubesse onde você estava. Muitos boatos foram criados em volta do seu sumiço. Eu fui até em um convento, no norte da Rússia. – ele me olhava intensamente. Ele parecia angustiado.
- Ei, mas agora eu estou aqui. E de alguma forma vamos arranjar um jeito de vivermos normais, no meio de toda essa loucura. – eu não sei se estava dizendo isso para ele, ou para mim.
- Claro que vamos. – ele me deu um sorriso otimista.
Passamos um tempo calado, com as ondas do mar preenchendo o silencio.
- Anne, você e... Matt. Não são tipo, um casal não é? – ele parecia meio envergonhado falando isso. Mas notei uma pontada de deboche em sua voz.
Senti meu rosto corar. Era meio estranho conversar isso com alguém, principalmente meu irmão mais velho.
- Eu não sei. – evitei olhar em seus olhos. Ele soltou um risinho abafado.
- Não sabe, mas quer? – agora dava pra notar o tom de preocupação.
- Você quer mesmo ter essa conversa?
- Ah Anne. Eu sou novo nessa parada de irmão mais velho. Coopera vai. – um sorriso tímido brotando no seu rosto.
- Vamos se dizer que eu gosto dele . - senti meu rosto formigar. Provavelmente eu estava na cor de um pimentão.
- Ah. – o sorriso desapareceu de seu rosto. – Eu já esperava isso. Você foi sincera, e eu vou ser. Não gosto de Matt.
- Eu já tinha percebido isso. Não entendo por que, ele é tão doce. – meu rosto formigou novamente.
- Com você ele é assim. Ele me odeia. Me culpa todo dia, por eu ter o transformado. – eu podia sentir a raiva em suas palavras.
- Ele não queria essa vida.
Sam deu uma risada, mas eu podia notar que não havia humor nela.
- É uma merda estar na mente dele.
- Imagino o quanto ele deve pensar bem de você. – disse acrescentando um tom de ironia.
- Não é isso que me incomoda. – suas bochechas ficaram levemente coradas.
- O que então? – a curiosidade mais uma vez latejando.
Ele me olhou meio constrangido.
- Ele fica imaginando vocês juntos. Juntos mesmo, se é que você me entende. Isso não é agradável. – ele abaixou a cabeça fazendo seus negros cabelos cobrirem seu olho. Mas eu podia ver seu olhar esperando minha reação.
- Você esta com ciúmes. – eu consegui falar enquanto ria. Era tão bom ter poder rir no meio de toda essa bagunça.
- Você é minha irmãzinha. Minha pequena. – ele levantou o rosto e suas bochechas estavam ainda mais coradas.
- E você é meu irmão. – me algum modo, pronunciar essas palavras me deixou mais leve. Eu me sentia mais feliz.
- Eu te amo Anne.
- Eu também Sam. – ele passou os braços pela minha cintura. E me abraçou calorosamente. O sorriso de menino mais uma vez em seu rosto. Um sentimento de alegria passou pelo meu corpo. Eu não me sentia mais solitária.
Eu fechei meus olhos, curtindo aquele momento. Aos poucos eu fui adormecendo. Algo maravilhoso aconteceu, eu finalmente pude dormir em paz. Sem sonhos estranhos, sem sentimentos alheios.
- Ei Anne. Acorde dorminhoca. – a voz gentil de Sam me acordou.
Notei que minha cabeça estava apoiada em sua perna e minha mãe junto a sua. Ele estava sorrindo. O Sol estava tomando seu alaranjado-por-do-sol. Eu estava toda suja de areia. Eu levantei rapidamente, me espreguiçando.
- Vamos? – Sam perguntou.
- Claro. – a areia parecia ter grudado no meu casaco.
A noite apareceu rápido, e antes mesmo que eu pudesse dar conta, a escuridão já havia tomado toda a estrada. Depois de alguns minutos pela estrada improvisada, pude ver de longe, as luzes da casa.
O lado de fora da casa, assim como a sala, estava estranhamente vazio a não ser por meia dúzia de vampiros que estavam perto da TV assistindo BBC. Para minha tristeza, Matt não estava com eles.
Sam fez novamente meu jantar. Ele realmente cozinhava bem. Ele permaneceu o tempo todo quieto. Eu estava sentindo algo estranho, como se fosse um sexto sentido, um pressentimento realmente ruim. Eu estava cansada. Toda essa mudança de vida era realmente exaustiva demais. Eu terminei de comer e pedi para Sam me levar até meu quarto.
- Boa noite Anne. – ele me beijou na testa, mas continuava com seu olhar distante.
- Boa Noite Sam.
Meu pescoço estava melhor, o vermelho forte tinha se tornado um pequeno rosado e não me incomodava tanto. Mas de alguma forma eu parecia diferente. O rosto que o espelho refletia, era mais bonito. Perecia mais iluminado. As maçãs do meu rosto pareciam mais salientes. Tomei meu banho rapidamente, e corri para a cama. Diferente de ontem, eu não me sentia tão solitária. Eu sabia que podia contar com Sam, e claro, com Matt. As palavras dele dizendo que me amava, desde a primeira vez que me viu, ecoaram varias vezes na minha mente. Meus olhos aos poucos foram ficando mais pesados e eu adormeci.
Infelizmente não havia sido como de tarde, um sonho sem visões-pesadelo. Eu sabia que aquele tormento ia começar. Estava muito escuro, eu não conseguia nem mesmo olhar para minhas mãos. O vento frio fazia a atmosfera ficar malévola. Eu me sentia... Excitada? Aos poucos a escuridão foi baixando, e eu pude ver que estava dentro de uma casa. A sala estava quieta, a não ser pela televisão ligada no mudo. No sofá estava um homem, cabelos grisalhos, aparentando ter uns 40 anos. Eu sabia que não estava ali, em corpo, era algo mais surreal. O homem dormia pesarosamente.
Creck. Um barulho na parte de cima da escada me assustou. Algo dentro de mim, mandava eu correr para ver do que se tratava. Eu era um fantasma, ou algo do tipo. O que quer que estivesse lá em cima, não me faria mal.
Eu subi as escadas correndo e no final do pequeno corredor, tinha uma porta semi-aberta e algo se movia lá dentro. A sensação de que algo ruim estava para acontecer parecia aumentar. Eu entrei no quarto silenciosamente, e entrei em choque no instante em que fiz isso. Eles estavam lá, meu tio e aqueles malditos encapuzados. Eles pareciam fazer parte da sombra que tomava o quarto. Augustus estava próximo a figura que dormia. Não dava para ver quem era de onde eu estava e minhas peras haviam congelado onde eu estava. Minha mão cobria minha boca, evitando em que eu chorasse alto, mesmo sabendo que eles não podiam me ouvir.
Seja quem fosse que estava na cama se moveu, fazendo todos que estavam ali se moverem ainda mais para escuridão. Menos meu tio, que não se moveu. Agora sim eu podia quem estava ali, a luz da Lua iluminou seu rosto. Era Alex, o menino da minha sala, e que eu estudei boa parte do meu colegial. Eu gemi de agonia, por não poder fazer nada. Algo passou por mim, um desejo, eu ouvia a pulsação de Ben tão claramente que parecia a batida de uma musica. Então eu entendi, eu estava sentindo o que aquele maldito estava sentindo. O desejo pareceu aumentar e eu focalizei o pescoço de Ben. Eu sabia o que ia acontecer em seguida, eu fechei meus olhos com tanta força que a minha cabeça latejava. O grito de dor de Alex ecoou na minha cabeça.
E então eu estava de volta ao meu quarto. A angustia me tomava por inteira e as lagrimas não paravam de escorrer. Eu precisava ver Sam. Talvez ainda pudesse fazer algo por Alex. Eu levantei rapidamente, ignorando minhas pernas bambas, elas pareciam que iam ceder a qualquer momento. Eu corri o máximo que pude até o andar de baixo, algo me dizia que Sam estava ali. Lutando para não tropeçar na escada. A sala estava cheia e como sempre todos os olhares vieram para mim, o que dessa vez era bem obvio pelo meu estado.
- SAM! – minhas ultimas forças foram gastas pra gritar o nome de Sam. Meus joelhos não agüentaram mais e eu sucumbi. Mas antes que eu pudesse cair, as mãos firmes de Matt me seguraram pela cintura.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Capitulo Catorze - Doce

A uns dez metros do chão estava uma casa da arvore, parecia pouco usada levando em consideração seu exterior. A madeira escura estava coberta por pequenas plantas que a usava como suporte. A escada para a casa descia pelo tronco e não me pareceu muito segura.

- Não mesmo, isso não vai agüentar meu peso. – ele me olhava implorativo, esperando que eu subisse.

- Vamos lá Anne, cadê seu espírito esportivo? – meu sorriso favorito brotando no canto de sua boca.

- Ele nunca existiu pra falar a verdade. – a mais pura verdade.

- Você não vai cair Anne. Confie em mim. – ele parecia tão seguro de si, e aquele olhar... Droga, aquele olhar me faria fazer qualquer coisa, a mais doida que me pedisse.

Olhei para a escada contando quantos degraus teria que enfrentar. Vamos lá Anne, doze degraus não é algo tão assustador. Assustador? Qual é Anne, você tem um irmão vampiro e dormiu numa casa lotada deles. Tomei fôlego e coloquei o pé vendo se era firme, Matt estava radiante, seu sorriso maior do que nunca. Minha mão suada não ajudou nada na subida, tentei ao máximo não olhar para baixo. Matt me olhava protetoramente.

A finalmente o décimo segundo degrau. A escada dava diretamente para dentro da casa. Nossa! Não esperava que uma casa da árvore tivesse um sofá de couro, uma TV e frigobar. Eu ainda não tinha me levantado e Matt já estava do meu lado.

- Como você...?

- Pratica. – ele estava com a mão junto a minha, me levando em direção à sacada.

Ele estava certo, a vista valia a pena. Era tudo tão lindo, mesmo com a densa camada de arvores, as flores amarelas se sobressaiam a tudo. Pareciam tão delicadas em meio a vento que as movimentavam espalhando seu aroma adocicado.

- Eu te disse que valeria a pena. – ele me puxou para um abraço.

Nossos corpos estavam juntos como um só. Enterrei minha cabeça em seu peitoral, e aspirei seu aroma adocicado. Era tão semelhante ao aroma das flores. Eu poderia ficar ali, para sempre.

Naquele instante tudo fez sentido, não era fascinação o que sentia por Matt. Era atração, eu estava apaixonada por ele. Eu queria dizer te amo, demonstrar tudo o que sentia naquele momento. Mas eu tinha medo, não dele fisicamente, tinha medo que ele me recusasse de alguma forma, que meu sentimento não fosse recíproco.

Olhei em seus olhos, ele me olhava intensamente. Meu sorriso preferido tomava seu rosto, era impossível não sorrir de volta. Eu nunca havia me sentido daquela forma, borboletas pareciam tomar meu estomago.

De repente tudo mudou, mais uma vez minha cabeça ardeu como se estivesse em chamas. Meus joelhos não pareciam conseguir mais agüentar o meu peso e eu acabei caindo, eu ouvia a voz de Matt chamando meu nome, mas não tinha forças para responder. Tudo pareceu rodar ficando tudo escuro, não completamente, uma luz forte estava a poucos metros de mim, iluminando alguém. Era uma mulher jovem. Seus cabelos eram loiros e caiam em cachos até sua cintura. Ela usava uma capa preta que cobria todo o seu corpo. Carregado em seus braços, estava um criança, um bebê que aparentava ter meses. A mulher abraçou a criança e a beijou na testa, disse algo que não pude entender. A imagem começou a ficar embaçada e escura novamente.

- Anne? Me responde, por favor. – Matt estava desesperado, com a mão em meu rosto.

- Droga. – tentei me sentar sem sucesso. Meu corpo estava mole e parecia não responder meus comandos.

- O que houve Anne?

- Não se preocupe Matt, não é a primeira vez que isso acontece. – consegui enfim me sentar.

Minha cabeça ainda doía e tudo em volta parecia rodar. Mesmo sem foco, estava claro que o rosto de Matt que ele estava preocupado. Tentei realinhar meus pensamentos, mas a imagem daquela mulher atormentava minha mente.

-Está melhor Anne? – a voz de Matt estava mais calma.

- Eu não sei Matt, não é a primeira vez que isso me acontece. É tão estranho. Na verdade está tudo errado. – desabafei.

- Não fique assim Anne, é complicado no começo, mas depois você se acostuma. – ele se sentou ao meu lado.

- Como vai ser daqui pra frente? Eu vou ter que me esconder pra sempre? Não vou mais a escola? Não vou poder sair sozinha? Eu não sei se agüento essa pressão Matt, não mesmo.

Apoiei minha cabeça no seu ombro, e abracei meu joelho. Ele suspirou e colocou sua mão em minha cintura.

- Vai tudo ficar bem Anne. Eu prometo.

Fechei meus olhos esperando realinhar meus pensamentos. Por que isso tudo tinha que acontecer logo comigo?

- Se isso te faz melhor, tem gente olhando seus pais. Eles estão bem Anne.

- Ah... – a palavra pais me parecia tão distante neste momento – isso me tira um peso. Eles provavelmente vão superar antes de mim.

- Eles não fizeram pro seu mal, Anne. Pense que neste tempo todo, eles estavam apenas te protegendo.

- Eu não gosto de mentiras. – minha voz saiu mais rude do queria.

Ele ficou em silencio. Concentrei-me em ouvir os pássaros que cantavam. Meu futuro era mais incerto do que eu imaginava.

- Matt, eu tenho uma duvida.

- Fale. – sua voz era curiosa.

- Assim como nos filmes, vocês... Vocês vivem eternamente?

Ele demorou pra responder.

- Sim e não. – ele parecia hesitante. – Depende do que você se... Alimenta.

Esperei que ele continuasse. Olhei em seus olhos distantes. Os olhando profundamente, reparei em algo que até então não havia notado, seus olhos continham ternura. Seu olhar encontrou o meu, o sorriso mais uma vez em seu rosto. Eu não conseguia olhá-lo daquela por muito tempo, abaixei a cabeça e senti todo o sangue indo para minhas bochechas.

- Se você se alimenta como os humanos. – ele continuou. - menos tempo de existência.

- Então se você se alimentar de sangue...

- Mais tempo de existência. – ele completou.

Acabei rindo, sem humor, de como ele evitava falar vida. Ele notou.

- O que houve?

- Não considera isso uma vida. – não era uma pergunta, estava claro no modo que ele falava.

- Não. – sua voz estava seca.

Não iria voltar a este assunto, percebi que isso o fazia ficar mal. Não tinha entendido como não havia surtado ainda, talvez a ficha não tivesse caído. Vampiros. Parecia algo tão assustador, mas ao mesmo tempo algo dentro de mim me dizia que não precisava temer, que com eles eu estava segura.

- Anne, você me promete uma coisa? – ele se sentou em minha frente, de modo que pudéssemos ficar olho a olho.

- Fale. – a curiosidade mais uma vez tomando conta de mim.

Ele pareceu hesitar, mas continuou.

- Se você tiver uma escolha, se Sam te permitir isso, por favor, eu te imploro, não aceite entrar neste mundo.

Ele me olhava intensamente e seu rosto se contorceu em dor. Ele não queria que eu me torna-se um deles. Mas se esse fosse o meu destino? Se não houvesse uma escolha? Eu estava ligada a esse mundo, mais do que eu poderia imaginar. Nas minhas veias corria a maior prova.

- Não posso te prometer isso Matt. Desculpe. – ele parecia esperar essa resposta. Ele me reprovava pelo olhar.

- Você não sabe o erro que poderá estar cometendo Anne. – a frustração tomou seu rosto.

- Não vejo nada errado no que você é, como você disse, há uma escolha, se eu não quiser me alimentar de sangue, eu não me alimento. – as opções começaram a surgir em minha cabeça, os prós e contras de cada uma.

Ele me olhou daquela forma implorativa que eu nunca resistia, desviei o olhar tentando não cair na tentação de prometer uma coisa que talvez não pudesse cumprir.

- Desculpe. – eu não queria deixá-lo mal como noite passada.

Ele se sentou ao meu lado e colocou a mão na minha cintura novamente. Eu apoiei minha cabeça em seu ombro. Queria tanto saber, se ele gostava de mim da mesma forma que eu gostava dele. Às vezes ele deixava transparecer seu afeto por mim, mas não queria acreditar somente nas minhas teorias, eu queria que ele falasse o que realmente sentia. Mas não sabia a forma correta de perguntar, e nem se teria coragem para o mesmo.

Minha vida tinha virado de ponta cabeça desde a última semana, tudo havia mudado. Meus pais, minha moradia, minha forma de vida. Talvez eu devesse mudar também. Tomar coragem para falar o que eu penso poderia ser a primeira iniciativa. Respirei fundo, tentando não pensar exatamente no que poderia acontecer, esse talvez fosse o segredo.

- Matt, me responde uma coisa com sinceridade?

- Fale Anne. – seu rosto estava grudado em minha cabeça, eu conseguia sentir sua respiração.

- O que você sente por mim? – tentei ser o mais direta o possível. Não consegui deixar de sorrir, minha tentativa havia dado certo, minha voz não havia travado ou algo do tipo.

Ele riu, me fazendo apavorar. Talvez eu tivesse sido muito antecipada.

- Como pode ser tão tola. – ele me virou, ficamos frente a frente, olho a olho. Ele estava perto o bastante de mim, eu conseguia sentir o seu hálito doce.

- Eu te amo Anne. Desde a primeira vez que te vi. Você ainda tem duvidas? – ele pronunciou cada palavra com intensidade e devoção.

Meu corpo parecia ter ficado mais leve do que nunca, me esqueci de tudo que passei e de tudo que eu poderia vir a passar. Ele me amava e nada mais importava. Minha boca se curvou num enorme sorriso que era o reflexo de como minha alma se sentia naquele momento. Ele afagou meu rosto e eu fechei os olhos, sentindo sua pele gélida.

- Anne? – sua voz estava mais suave do que nunca.

Eu abri meus olhos, achando que iria acordar de um sonho bom e retornar a todo aquele pesadelo. Mas ele estava ali. Esperei que ele continuasse.

- Agora quero que você me diga. O que sente por mim? – em sua testa surgiu uma pequena ruga.

Eu queria dizer que o amava até minha voz falhar.

- Droga. – ele se levantou e espiou pela sacada.

O que poderia ter acontecido? Estava tudo tão perfeito. Ele segurou minha mão me fazendo levantar. Ele sorriu pra mim.

- Está tudo bem Anne. Só temos que sair daqui. Sam está te procurando.

Ele desceu as escadas primeiro, e me aguardou lá embaixo. Andamos de mãos dadas por uma parte da trilha. A resposta de sua pergunta, ainda estava engasgada em minha garganta.

- Parece que você tem um serio problema de audição moleque. – Sam pareceu se materializar na nossa frente. E estava na cara que ele estava bem furioso.

Ele foi em direção ao Matt, mas antes que ele pudesse fazer alguma coisa eu me meti na frente dos dois.

- Sai da frente Anne, não quero te machucar. – ele parou na nossa frente.

- Não vou sair daqui Sam, nem a força.

Ele revirou os olhos. Logo atrás de Sam, Pablo e mais um homem moreno alto apareceram.

- Onde estavam? – Sam perguntou olhando para Matt.

- Na casa da arvore. – olhei para Matt, seu rosto não estava tão diferente do rosto de Sam.

- E o que eu havia dito a você Matt? Eu não quero a Anne fora daquela casa, está me ouvindo? – Sam cuspia as palavras.

Aquilo me irritou profundamente.

- A claro, só esqueceram de falar para a Anne que ela não poderia sair da casa, qual é Sam? – disse, ironicamente.

- Vamos Anne. – ele me puxou pelo braço, mas eu me soltei segurando mais uma vez a mão de Matt.

- Não, quero ficar com Matt.

- Eu preciso falar com você urgente Anne, é sobre o que me mostrou mais cedo. – talvez ele tivesse descoberto algo sobre meus pesadelos.

A curiosidade mais uma vez me venceu. Olhei para Matt e ele assentiu com a cabeça. Andei em direção a Sam, ignorando sua mão estendida. Os dois homens andaram em direção a Matt. Olhei para eles, o homem moreno propôs uma corrida e Matt concordou, mas seus olhos ainda presos em mim.

- Ainda quero a minha resposta. – reconheci a voz de Matt, mas quando fui olhar, não havia mais ninguém onde ele estava.